terça-feira, 30 de agosto de 2022

Para que a Terra não esqueça

 


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Arte contemporânea: prestígio ou capitalismo?


Um corrosivo panfleto de Gianfranco Sanguinetti questiona o prestígio de que goza a arte contemporânea para fazer a denúncia da sua "essência corrupta" e a sua total subjugação à moral do lucro.

(Dos jornais)

 

   No seu livro Sanguinetti refere “certa arte contemporânea”, o que é mais correto. Além de que essa arte, em tempos pós-modernos, é geralmente medíocre, pedante e aposta na incultura ou falta de dignidade dum público médio e grande burguês endinheirado e cheio de snobismo. Ou joga na propaganda rasteira, isto do outro lado, para fazer vingar um esquerdismo vigarista e obscurantista como nos tempos da cortina de ferro.

 Raul Lopes da Silva


In memoriam de Manuel de Castro

 




A ERC JOSAMU JOVE

 

Nós os intocáveis, os imundos, recusamos
nossa vida à condição comum.
Porque é intemporal a rosa que nos leva
entre o dia e a noite.
Nós os derrotados, impuros, oferecemos
nossa miséria a um significado
oculto e diferente –

asa branca na varanda
nome escrito nos telhados
estrada atravessando a terra de ninguém

Nós os últimos dos últimos coroamos
impérios e jardins

 

 

 

CARTA

 

esqueço-te com a terna complacência do silêncio

habitual das horas no seu movimento

e no entanto restou um perfume quase imperceptível

do olhar por uma vez aceite

em mim, um olhar que julguei

fosse o meu amor, a ilusão

de um gesto que olhamos como

se nos pertencesse e no entanto

nos é alheio.

Eu havia contribuído integralmente.

A terra foi por um instante pura

através do teu corpo elástico e pausado.

 

 

ÚLTIMO POEMA POSSIVELMENTE DE AMOR

 

recorda

como se os dias não fluíssem em dias

e para ti fosse um nítido jogo de músculos

meu braço no teu corpo    anfiteatro

da mais pura derrota rumo às constelações

 

eis-me descoberta

de tudo que se arrisca sem limites

construído pela coloração de globos de vidro

iluminados e submersos

 

para o teu nome

um novo mecanismo de linguagem

para o teu corpo

memória      ciclo perfeito

dos meus desejos de pedra e de violência

 

tu

única para quem fui      adeus      o homem sem comédia

 

   O autor dos livros “Paralelo W” e “A Estrela Rutilante”, falecido aos 36 anos de idade em Setembro de 71, ficou como um dos poetas mais significativos da segunda leva surrealista.

  Aqui lhe celebramos a memória e a sua poesia de singular qualidade.


José do Carmo Francisco, Abel Pereira - uma memória perdida talvez no Poço do Bispo

 


(1925-1985)


Sou um soldado raso do jornalismo. Nunca serei director de nenhum jornal mas essa  situação ocorreu em 1963 em Vila Franca de Xira quando na Escola Comercial fui director do jornal de parede «Velas do Tejo». Eram feitos à mão os textos e os desenhos desse jornal que, na arte final, se colava a uma folha de cartolina. Tudo era efémero, tudo se perdeu nas emboscadas do esquecimento, a cartolina, os textos, os desenhos, a paixão, o título, os leitores no corredor entre as salas. É essa memória, são essas as memórias que eu quero invocar não para mim (que não sou ninguém) mas para Abel Pereira. Abel Trindade Pereira de seu nome completo, nascido em 22-3-1925 na cidade da Guarda, freguesia da Sé, eterno chefe de redacção do «Diário Popular» mesmo quando foi director de «O Ponto» e director-adjunto do «Diário Popular». Claro que a palavra eterno é relativa de modo absoluto e basta um olhar mais atento para os livros da casa onde passei férias no Verão de 2022 para perceber que a sua morte física em 8-1-1985 (tinha só 59 anos) foi replicada na página 212 do livro «Portugal Contemporâneo» organizado por António Reis para as Selecções do Readers Digest. Nessa página do terceiro volume Abel Pereira é referido como Abel Fonseca e passado o primeiro momento de repúdio pelo erro crasso que regista o nome (Abel) mas lhe atribui outro sobrenome (Fonseca) lembrei-me de uma hipótese. Se um assunto similar lhe passasse pela honrada banca de trabalho do jornal da Luz Soriano é possível que a sua bonomia avançasse com uma piada parecida com «Esta coisa vai acabar no Poço do Bispo». De facto a sua sagacidade poderia tê-lo levado a perceber de imediato a ligação entre os nomes Abel Pereira (correcto) e Abel Fonseca (errado) pois tudo junto pode dar Abel Pereira da Fonseca que é o nome dos estabelecimentos de vinho e seu derivados que Fernando Pessoa frequentou quando o mesmo saía a meio da manhã da firma Moitinho de Almeida para praticar o seu «flagrante delitro». Mas é óbvio que isto não aconteceu em 1985 quando o Registo Civil regista a sua morte em 8 de Janeiro. Está a surgir no meu pensamento não como desculpa do erro tenebroso mas como possível ou provável explicação para o desvio onomástico. Num outro registo lembro a bonomia de Abel Pereira quando aos sábados de manhã na Cooperativa dos Bancários ali ao Arco do Cego ele me convidava a interpretar os rótulos do peixe congelado. Outras vezes falávamos da frases feitas como por exemplo «Todas as horas nos ferem, a última mata-nos» ou «A única medida do amor é amar sem medida.». A primeira foi lida por Baptista-Bastos numa igreja das Ardenas, a segunda é de Santo Agostinho e está no livro «Consolação número três» de Santos Fernando, colaborador do «Diário Popular» com a crónica «Os grilos não cantam ao domingo». Abel Pereira sabia tudo, era uma Wikipédia antes do tempo. Hoje a Wikipédia nada diz sobre a sua trajectória de jornalista.


Bob Dylan, Lay down your weary tune

 



terça-feira, 23 de agosto de 2022

Para que a Terra não esqueça

 

Quem é o "Rasputine de Putin"?

 

Alexander Dugin defende uma Eurásia russa para combater os EUA e um "fascismo revolucionário", ao mesmo tempo que quer "desnazificar a Ucrânia". É ele a voz que sussurra ao ouvido do Presidente russo?

(Dos jornais)

 

“Fascismo revolucionário”?! Hum, hum…Agora percebo porque é que os do PC apoiam o chefão russo. Aves da mesma pena andam juntas, como diz o ditado.

Romualdo Figueira


Dois poemas de Floriano Martins

 


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TRATADOS DA SOMBRA

 

3. O que discute sempre o poema é a ideia

da personalidade. Somos gloriosos na paródia

de nossos próprios atos. Será este o progresso

da consciência? Há uma grave teia de anomalias

que se fia na expressão dos dias. Whitman

dilacerado por sua humanidade, Bataille deslocado

por seu riso solto. Quais os antecedentes

conjurados da dor, as sombras pronunciadas

por suas visões? À luz particular de cada

cena as ideias são sempre distintas. O poema

não repercute senão o material de sua memória.

Desconfia do homem quando se recusa a criar.

Ressurgem as formas da dor de sua metafísica:

– "muda-me a cada toque o tolo que sou em ti".

 

4. O poeta cai de suas metáforas. Ensaiamos

o enigma comum de situação e lugar, porém

não suportamos o peso das coisas que em nós

se preparam. Sempre ignoramos o espetáculo

de nossas ruínas, distinto cenário onde atua

o homem como o verme da própria espécie.

Ainda que se renove o poeta com suas perdas,

resta um raminho ausente, uma corda, uma visão

da beleza, uma ilusão do ser, algo que torna

incessante a queda e o poema um código de falhas.

Na cena que se retrata, o mesmo súbito relâmpago:

– "O que fiz de ti?" – Livro decomposto

em repetições. Hamlet encharcado de ilusões.

Haverá sempre algo ali, impossível de se seguir.


Perguntas de Lino Mendes, respostas de NS

 

A NOSSA LÍNGUA

 

1)- A LÍNGUA é viva porque naturalmente aparecem novas palavras e, as que existem, podem passar a ter (mais) outros significados?

Entretanto há quem considere que “os idiomas se adaptam às pressões do ambiente e são determinados pela estrutura social dos seus falantes". E que as línguas mais faladas tendem a ser mais simples.

O que tem a dizer sobre o assunto?


NS – Sim, tudo isso tal como refere.

 Os idiomas adaptam-se, tal como é aqui dito – mas nunca um idioma pode ser forçado a adaptar-se, mais grave ainda se o for por motivos de baixa política ou por oportunismo de qualquer ordem (comercial, industrial, etc)!

  A adaptação é um facto natural e que decorre de uma progressiva junção da passagem do tempo e das transformações que essa passagem produz. Nunca pode ser forjada artificialmente – no caso de o ser só produzirá frutos mortos, tal como sucede com o famigerado acordo ortográfico: imprudente, ridículo e frequentemente insano.

 A língua é um instrumento de comunicação. Se a comunicação (como na nossa sociedade fundamentalmente dominada por ritmos ao serviço do interesse imediatista dos grupos argentários) se vulgariza ou primariza, é lógico que a língua se torne mais simples (eu diria antes mais simplista ou, mesmo, mais simplória…).

 

2)-Concorda que as novas “entradas” nos dicionários se verifiquem ao critério dos editores, e não haja uma “comissão científica” que o avalize?


 NS – Não concordo. Deixar-se tal caso ao critério dos editores é semelhante a deixar-se ao critério de um qualquer editor a estruturação de um livro de zoologia, ou de química, ou de física…

  A língua é um organismo vivo, parafraseando Aristóteles e que, deixado ao sabor de gentes frequentemente interesseiras, pode sofrer tratos de polé que o magoem irreversivelmente.

 

3)-O que justifica a alteração ortográfica? Por exemplo, a alteração de “pharmácia” por “farmácia”.


NS - Há simplificações que fazem sentido – quando tal não colide com a clareza, a adequação e, digamo-lo também, a própria elegância linguística.

  Mas nada justifica que se altere uma língua porque tal foi exigido ou ardilosamente sugerido por entidades políticas, etc, visando apenas a subordinação de um povo falante e escrevente (com uma determinada criatividade!) a interesses de momentâneos dominadores, de talha grosseira ou oportunista ainda por cima!


4)-Não seria antes de considerar uma “Língua–Mãe” sendo as outras suas sucedâneas? Não será que o grande problema está no “falar” e não no “escrever”?


 NS – Falemos claro! Sem subterfúgios e sem temores estimulados pelo “politicamente correcto” ao serviço dos que, fingindo-se democratas, não o são realmente. A língua portuguesa é a língua criada pelo colectivo português, pelas gentes de Portugal. Depois, é de levar em conta que esse falar e escrever portugueses, tendo navegado para outros locais e sendo adoptado por outras gentes, muito legitimamente ganhou outros tons e outras características. É o falar, o escrever, de outras humanidades. Muito próprio e muito digno! Mas não se venha exigir que nós, por sermos menos milhões que esses milhões de falantes, abandonemos a nossa especificidade, constrangendo-nos a falar de forma artificial, escrever de forma artificial com o único intuito de, sabe-se lá por quanto tempo, os donos do nosso viver colectivo fazerem mais facilmente negócios e abancarem melhor à mesa dos banquetes em que se envolvem com outros da mesma igualha, como eles fazedores de fortuninhas!


5)-Haverá outros interesses para além do “cultural"?


NS – Eu diria mesmo mais, como os primos Duponts do Tintin: interesses culturais devem ser a última coisa em que esses fabianos pensaram/pensarão…! E tem-se visto, agora que já passaram uns anos sobre o desconchavo, que interesses culturais só lá estarão para disfarçar a protérvia e nada mais!


6)-Agradeço que acrescente tudo o que considere de essencial…


NS – Apenas acrescentaria que é triste, é lamentável, que se tenha artilhado uma manobra deste tipo (acordo ortográfico) que não foi acordo nenhum, mas apenas a maneira de curvar a língua portuguesa, de forma arbitrária, autoritária e ardilosa, a manobrismos de baixa estirpe e muito baixa cultura. Desta pessegada não saiu nada de válido, nada de cultural se acrescentou. Apenas ficou provado como gentes de letras grossas (ou grossistas…de tipo em estilo intendência) pode agir impunemente ou quase por dispor do poder político. Imagina-se, por exemplo, a França ou a Inglaterra, países que têm espinha dorsal linguisticamente falando, a alterarem o seu idioma para agradarem ou acatitarem seja quem for? Eu diria que a alteração que esses mandantes têm tentado e estabeleceram como regra abstrusa lhes retrata a figura: gente sem decoro e sem verticalidade… para mais não dizer. E por aqui me fico…!


The Red Army Choir Alexandrov, Kalinka

 



sábado, 6 de agosto de 2022

Faleceu Ana Luísa Amaral

 




   Vítima de doença prolongada morreu a poetisa Ana Luísa Amaral, aos 66 anos.

   Também tradutora e ensaísta, é autora de mais de três dezenas de livros. Na academia, dedicou-se às áreas de poéticas comparadas e estudos feministas. Foi galardoada, por várias vezes, com prémios significativos certificando a sua alta qualidade de escritora.

   Citamos, dos jornais: No ano passado, em entrevista à Lusa a propósito da edição do livro “Mundo”, defendeu que a “poesia não tem de ter mensagem nenhuma”, criticando mesmo a “galeria de diferentes verdades” que “extremaram” as discussões de forma “insuportável”. O que tem de haver na poesia, dizia, “é a paixão pela língua e pelo que os outros escreveram. Todo o escritor é um leitor. Sempre”. “Isso é uma ideia um bocadinho neorrealista, na chamada poesia comprometida, que a poesia tem que ter uma mensagem, de passar uma mensagem da desigualdade, da luta de classes. Nós, enquanto seres humanos e cidadãos e cidadãs, sendo comprometidos com o mundo, é natural que essas preocupações de alguma maneira transpirem para aquilo que nós fazemos, que nós escrevemos”, explicou.

   E mais adiante: Foi por isso que a “chocou bastante”, certa vez, quando alguém lhe disse que “as palavras não lhe interessavam para nada, o que lhe interessava era o que elas convocavam”. “Mas então, onde está a poesia? A poesia é feita de palavras”.

  Evidentemente que quem lhe disse tal coisa tinha plena consciência do facto. Mas o que lhe interessava realmente, ao veicular tal conceito, era cifrar um dado: para esse tipo de gente o que conta é a supremacia da propaganda – e da mais rasteira. Como a que se praticava nas ditaduras, todas elas, de que este tipo de gente é partidária.

   Ana Luisa Amaral, era pois não só uma autora de qualidade mas também uma pessoa sensata e lúcida.

  Lamentamos profundamente o seu desaparecimento e apresentamos à sua família as nossas condolências.

Nicolau Saião

Joaquim Simões


terça-feira, 2 de agosto de 2022

Para que a Terra não esqueça

 

   A experiência mais bela que podemos ter é o mistério. É a emoção fundamental que está no berço da verdadeira arte e da verdadeira ciência. Quem a não conhece e não pode mais maravilhar-se é como se estivesse morto pois os seus olhos estão ofuscados.

Albert Einstein


Um poema de Dusan Matic

 


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AMANHÃ NOVAMENTE

 

Eu sei o que me espera

Uma carga de terra escavada

Não, não importa, eu nem vou saber

Não vamos falar sobre isso.

 

Não é amanhã

Este não é o momento que inevitavelmente está a chegar

E cheio de velas e flores leves

Não é a eternidade que é mais rápida que o som e

Mais rápido do que uma estrela: um raio que de repente

Liga todas as lâminas de sangue.

 

Eu sei o que me espera

Não vamos falar sobre isso.

 

Não é amanhã

Amanhã é de novo e de novo e de novo

Amanhã é a maré que borbulha de novo

Amanhã o banco estará no parque novamente de qualquer maneira

Acima de um cemitério que ninguém suspeita

Sim, há relva sob o relvado

(A equipe de arqueólogos vai chegar tarde novamente

Só depois de amanhã)

Os nomes do nosso esquecimento foram apagados há muito tempo.

 

Eu sei o que me espera

Uma carga de terra descartada

Não, não importa, eu nem vou saber

Não é amanhã.

Amanhã a casa é nova

A casa já está velha

Escada suja

O fedor da sala

Uma casa com uma parede cinzenta-amarelada

Com uma parede cheia de palavrões e nomes.

Amanhã a casa está velha

Com parede caiada

(Canção da manhã)

Com uma parede tão diferente que afinal a parede fica

do outro lado da rua

Tanto que não é tão durável, afinal.

 

Amanhã é o sol e o desespero

Desespero e o sol.

 

Eu sei o que me espera

Cinzas a serem levadas pelo vento

Não é amanhã

Não é a hora que inevitavelmente está a chegar.

Amanhã é o mesmo sofrimento e palavras aleatórias

o capitão Nemo que fere

Amanhã é o mesmo mar que o mesmo

Ele repete

Amanhã é uma nova risada e uma nova alegria

Amanhã é vinho hoje

 

Amanhã o quarto é novo

Alguém está nele a chorar

Amanhã é o quarto dois

Nele, outra criança canta uma velha canção

Para entender de cor, aprende

Amanhã é o quarto três

No espelho acordado e cego

Sonhos de ombro nu

Amanhã é uma rua sem medo

Amanhã é um café com terraço tranquilo

Amanhã é um campo que não tem fim

Amanhã é um momento de frágil chegada.

 

Amanhã são pessoas que carregam um clima frágil

Amanhã eles estão mortos que supera os mortos amanhã.

 

Amanhã é desespero e o sol

Desespero e o sol.

 

Amanhã é um novo sofrimento e palavras acidentais

Eles alimentam-te

Amanhã é um novo mar que está a envelhecer

Repete ele.

 

Amanhã é a mesma risada

A mesma alegria.

 

Amanhã é vinho hoje

 

Eu sei o que me espera

Esquecendo de me absorver sem deixar vestígios

Não, não importa, eu nem vou saber

Não vamos falar sobre isso

Amanhã é a hora inevitável dessa frágil vinda

Amanhã, as pessoas estarão frágeis porque inevitavelmente carregam o tempo]

Amanhã é esquecer o que transcende o esquecimento de amanhã.


O amanhã já está aqui entre nós hoje.

(Tradução de ns)

Lino Mendes, Sobre folclore

 


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Quem quiser estudar profundamente o folclore, e para isso tiver capacidade que para todos não será igual, não pode ignorar os “saberes empíricos”, só por si insuficientes mas indispensáveis, não pode esquecer-se que pela UNESCO o mesmo foi reconhecido como “cultura tradicional e popular”, sendo por isso as raízes de todos os usos e costumes, de todas vivências quando as mesmas não eram adulteradas por valores estranhos trazidos pelo progresso que abriu as portas à globalização. Por isso, essa coisa do não ligues que não passa de folclore, já deveria estar varrida da mente dos que não gostam do povo.

Mas nada me admira que ainda haja quem não compreenda que o “popular” e o “erudito” são duas faces da mesma moeda, a Cultura, onde ocupam lugares e não patamares. E é o respeito por estes princípios que nos garantem as nossas “raízes”, o “tradicional”, a nossa “identidade cultural”

Por incrível que pareça, o mistério da Cultura ou entidade a quem o delegue, não tem um pelouro que a questões do Folclore e Outros Patrimónios “responda prontamente e com credibilidade” e é urgente que o assunto seja resolvido.

                

EDUCAÇÃO PARA A CULTURA DA TRADIÇÃO                                                                                                                                                                               

Um povo sem memória não existe

Sem dúvida que para cada um de nós a nossa terra é sempre a melhor. Não pelo facto de na mesma se ter nascido, o que até pode ter acontecido por um simples acaso, mas porque ligado a ela nos formámos, naturalmente nela encontramos as nossas raízes - que nos caracterizam e enriquecem nas diferenças.

É o FOLCLORE, são as tradições, são os usos e costumes a marcarem um meio quando ainda não influenciado por padrões universais. E são essas RAÍZES que hoje, mais do que nunca, interessa preservar e constituem a nossa afirmação neste derrubar de fronteiras na Europa como no Mundo.

É QUE UM POVO SEM MEMÓRIA NÃO EXISTE, pelo que é preciso que este País, que é o nosso, vá sendo construído em português. O que não significa um erguer de barreiras, um delimitar de fronteiras a não ser as culturais. Porque é nas diferenças que o convívio entre os povos se consolida, assim como na identidade se reforça a evolução natural das coisas.

É a maneira de ser e de estar que caracteriza um povo. E por isso mesmo, quando hoje se pretende definir o que é um homem culto, uma certeza de imediato se perfila - a de que não importa a soma de conhecimentos, se ignorada for a realidade do meio em que nos inserimos, nos formámos. Verdade esta que, sem manipulações, deve estar presente a partir dos bancos da Escola, já que a criança só sabe (e pode) amar aquilo que não desconhece.

Temos, pois, que importa compreender e defender o nosso património, a nossa identidade, até porque o desenvolvimento só coabita com uma população culturalmente evoluída, o que não pode acontecer no desconhecimento das raízes que nos definem, no ignorar das memórias do povo que somos.

 

É, pois, um facto, que um povo sem memória não existe. Há por isso que a preservar investigando, reconstituindo e divulgando. Sendo que, inclusivamente a deslocação de um grupo de folclore às nossas Comunidades espalhadas pelo mundo será sempre um bom serviço prestado ao país, desde que esse mesmo grupo seja credenciado por um correcto trabalho de pesquisa, seja de facto representativo. Temos, pois, que investigar, reconstituir, preservar e divulgar as nossas tradições, se torna prioritário.

Não há no nosso país uma “Educação para a Cultura da Tradição”, embora sejamos o povo que mais a respeita; não temos nas nossas Televisões um único programa que a promova - aliás não há um conceito de qualidade, e de representatividade, sempre que  se escolhe um grupo - porque o mesmo tem que assentar o seu trabalho em  bases científicas já que, como se sabe, a Etnografia e o Folclore são ramos auxiliares da Antropologia Cultural. Sendo por exemplo triste ouvir um nome sonante da Televisão perguntar a responsáveis de grupos que lá vão, sem critério de escolha, quem escreveu as cantigas e desenhou os fatos, desconhecendo que naturalmente tudo isso teve os seus autores cujos nomes se perderam no entanto no decorrer dos tempos, acabando por cair no domínio público e ser assimilado natural e voluntariamente pelo Povo.

Refira-se, entretanto, que quando dizemos que se devem delimitar as fronteiras culturais, queremos referir que se deve respeitar a cultura tradicional, outra maneira de dizer folclore. Porque se este não mais evolui, a tradição continua a evoluir, dando lugar a novas formas de cultura que serão estudadas e terão o seu lugar no mundo global da cultura. Assim como quando se diz que “investiguemos”, devemos ter consciência de que começar do zero, já não se pode recuar no tempo como tem sido possível, pois o livro da Sabedoria do Idoso, está a perder as últimas páginas.

Como já dissemos, é preciso que este País “vá sendo construído em português “é preciso que os nossos jornais ponham de lado os “estrangeirismos” e os “DICIONÁRIOS” não façam as novas entradas a seu belo prazer.


Arlindo de Carvalho, Hortelã mourisca

 



Aos confrades, amigos, adeptos e simpatizantes

     Devido a um problema informático de última hora, não nos será possível fazer a postagem desta semana.    Esperando resolvê-lo em breve,...