terça-feira, 28 de junho de 2022

PÓRTICO

 

 ANTOLOGIA INTERNACIONAL “EMERGÊNCIA CLIMÁTICA”



Fotografia de ns


   A editora italiana Edizioni Universum, dirigida por Giovanni Campisi, deu a lume há poucos dias a antologia internacional “Emergência Climática”, no sentido de chamar a atenção, de forma alargada, para os problemas ecológicos a que está submetida “a nossa mãe Terra” (sic) e visando mais uma vez despertar, mediante um poemário significativo, a necessidade de todos pugnarmos pela melhoria do relacionamento com a Natureza, que urge ser protegida de forma empenhada e real.

  Esta antologia, com poemas no original e traduzidos em várias línguas europeias (italiano, inglês, francês, espanhol, grego, austríaco…) foi prefaciada por Enza Agnelli. Quarenta e um autores de 23 paises, distribuídos pelos idiomas que escolheram para as traduções, compõem o poemário, que depois de lançado em Itália está a ser difundido em vários países – europeus, africanos e do Novo Mundo.

   Convidado a participar na antologia, fi-lo mediante o meu poema “Árvore”, constante no “Os objectos inquietantes” e que agora aqui vos deixo de juntura com a tradução, por Giovanni Campisi, na língua italiana.

 

ÁRVORE

 

Gostava de ter árvores como alguns têm flores.

Árvores, muitas árvores: laranjeiras, pinheiros, uma oliveira ao pé

do mar, se eu tivesse uma casa a sotavento das dunas

como as que se adivinham em certos quadros de Cézanne

se a luz é muito clara e permanece

com velhos nomes gregos que não sei.

Nespereiras, limoeiros, uma que outra ameixoeira

parecendo, vistas de longe, ser

de uma substância estranha e desconhecida.

Não me importava, até, de em tardes de calor

ter dentro do meu quarto um abrunheiro donde pendesse

um decente e fraternal cadáver.

 

A verdade é que não me assusto facilmente

e tenho confiança no reino vegetal.

 

Malus sieboldi, catoneaster dielsiana, vós sois

os mais exactos filhos do mundo.

 

Gostaria de me rodear, um dia, de videiras

- essas árvores turvas da esperança -

e quando digo rodear sei o que digo, pois

queria que se enrolassem nos meus rins, nas espáduas

me descessem pelas pernas e lançassem

perto do meu sexo folhas novas

e que, ao lusco-fusco, enquanto no céu passam

os pequenos satélites mortais e luminosos que o desespero

do Homem lá coloca, por surpresa se transformassem

em plantas de gesso de frutos impensáveis.

 

Chego a perturbar-me por vezes se vejo

uma árvore junto a um hospital

 

Não sei porquê creio que me lembro mais

ou sinto mais

agudamente os níveis dolorosos das origens

do cristal, da carne

os esponjosos tecidos da sombra e da frescura

das cores da morte pronta para o grande tumulto.

 

Que medo, em certas noites, ver

de noite uma árvore

 

Sei perfeitamente que uma árvore é um símbolo

obscuro da nossa vida, principalmente da nossa vida

que não houve. Mas mesmo assim

dentro das ruas, dentro das casas

as árvores têm um outro entendimento

um mistério muito delas

- e não completamente inventados -

pois não desprezam a agonia dos homens, o choro dos homens

o seu riso, a sua fome, os sinais todos

que o Homem podia e devia ter.

 

As árvores começam e acabam sem amor

e sem ódio.

 

                                    *

ALBERO

 

Vorrei avere alberi come alcuni hanno fiori.

Alberi, tanti alberi: aranci, pini, un ulivo in riva al mare,

se avessi una casa a ridosso delle dune

come quelle in certi quadri di Cézanne

s’intuisce se la luce è molto forte e resta

con nomi greci antichi che non conosco.

Nespole giapponesi, limoni, uno più di altri il susino,

che da lontano sembravano di una sostanza strana e sconosciuta.

Non mi importava nemmeno che nei pomeriggi caldi

avessi in camera un albero di prugnolo

su cui pendeva un cadavere decente e fraterno.

 

La verità è che non mi spavento facilmente

e ho fiducia nel regno vegetale.

 

Malus sieboldi, cotoneaster dielsiano,

siete i figli più precisi al mondo.

 

Vorrei circondarmi, un giorno, di viti

- quegli alberi fiochi della speranza –

e quando dico circondare so cosa intendo,

perché volevo che si avvolgessero intorno ai miei reni,

sulle mie spalle, scendessero

lungo le mie gambe e gettassero

nuove foglie vicino al mio sesso

e che,al crepuscolo, mentre in cielo passano

i piccoli satelliti mortali e luminosi che la disperazione

dell'Uomo vi depone, a sorpresa si trasformassero

in piante di gesso dai frutti impensabili.

 

A volte mi arrabbio se vedo

un albero vicino a un ospedale

 

Non so perché penso di ricordare o sentire più

acutamente i livelli dolorosi delle origini del cristallo, della carne

i tessuti spugnosi dell'ombra e della freschezza

dei colori della morte pronti per il grande tumulto.

 

Che paura, in certe notti, vedere

un albero di notte.

 

So perfettamente che un albero è un oscuro

simbolo della nostra vita, soprattutto della nostra vita

che non esisteva. Ma anche così,

dentro le strade, dentro le case,

gli alberi hanno un'altra comprensione,

un mistero in più di loro

- e non del tutto inventato –

perché non disprezzano l'agonia degli uomini,

il grido degli uomini,

il loro riso, la loro fame, tutti i segni

che l'Uomo poteva e doveva avere.

 

Gli alberi iniziano e finiscono senza amore

né odio.

 

 Nicolau Saião - Poeta, pittore, saggista, traduttore e attorerelatore. Premio nazionale “Rivelazione 90” dell'Associazione Portoghese degli Scrittori con il libro “Gli oggetti inquinanti”. Altri: “Flauto di Pan”, “Le occhiate perse”, “Passaggio di livello” (teatro), “Le voci assenti” (cronache e saggi), “La scrittura e il suo contrario”.


Para que a Terra não esqueça

 


Alfonso Bonifacio


   Do poeta é preciso exigir uma única coisa: não deixar de ser poeta. Ele não deixa de ser poeta se se cala, se não escreve, se não publica. Mas ele deixa de ser poeta a partir do momento em que consente em escrever a língua que mente, a “língua de pau”, a língua morta, mesmo se alinha milhares de versos.

Radovan Ivsic


Um poema de Eduardo Bento

 


A CASA

1. Este é o chão, aqui se molda a casa. Deste recanto ouvirei a coruja
e o noitibó esconjurando os astros. Abeiro-me já da janela para
sorver o sol ou ver a chuva. Aqui invento o olhar onde uma paisagem
me fala de todas as partidas e de nenhum regresso.
Será aqui a casa. Ela começa no bater do coração, ali na lisura das
paredes, onde a tarde perdeu todas as sombras, lá onde só resta a
pura fulguração da luz. A horizontal luz do teu olhar. Ah, faltam os
espinhos da roseira para prender os sonhos e o verde da camélia
para entreter os olhos.

2. O que sobrou do ferro, da pedra, da argamassa, do alisar das mãos
é agora a casa. Foi aqui que germinou o lancil e se abriu a porta e tu
disseste: Quero uma mesa que acolha todos os homens.
É macio o côncavo do dia. Mansa é a noite. A casa acolhe agora o
silêncio de muitas vozes. E a ternura dos gestos prende-se à fulguração
do lume, o sussurro da chama abranda a inquietação das horas e em
toda a casa perpassa o som dos teus passos.
Diria que o soalho acaricia os pés, as mãos acolhem a brancura do riso.
É aqui a partilha do pão, a maciez acidulada do vinho na toalha onde
ardem serenas palavras. Esta é a lenta demora, o lento declinar das
estrelas, no breve contentamento... Aqui é a casa.

3. Nenhum lugar é nosso e apenas resistimos ao pó. Mas agora é o tempo
da casa. Começa a cumplicidade dos sonhos, o desvendar deste recanto, a
intimidade das horas.
É preciso chegar à medula da casa e aí interrogar o corpo, beber devagar
o declinar dos dias, entretecer a noite e descobrir que o momento é toda
a eternidade. Retarda o encontro com a rua, com a urgência do tempo,
deixa que a ternura navegue pela casa e escuta o palpitar dos astros até
que a estrela da manhã se apague na lentidão do crepúsculo.

4. Podemos rodear a casa. Soletrar os ângulos. Tocar o branco da cal,
a dureza da pedra. Aqui demoro mas tão brevemente como é breve a
sombra do muro.
No jardim um pássaro acende a tarde e é verão...(Chamaste ou é o apelo
da noite que aí vem?)

5. Estamos sempre mais longe e não há regresso. A distância é o nevoeiro
dos dias, o apagamento da memória...Agora a casa é uma palavra em ruínas.
A mesa é feita de lugares vazios. A humidade saboreia a caliça e há raízes
investindo com os muros. A trave apodrecida é um mastro caído à espera
de outro mar.
Adivinho antigos rumores, vozes dispersas. Aqui um horizonte se apaga, breve
e última respiração das coisas. Agora só se ouve a débil pulsação da noite.

 in O NEVOEIRO DOS DIAS 2009, Ponte Editora

 

   Colhêmos este belo poema, tomando assim contacto com o seu A., no espaço anteriormente mantido pelo editor e livreiro José Antunes Ribeiro – também presente nesta postagem – “O voo da coruja”, que dentro em breve vai sair em revista, materialmente dada a lume mediante os meios habituais.

   Dirigida pelo poeta e pintor Hugo Beja, certifica a volta ao bom combate – não se deixando vencer pelas dificuldades por cá colocadas infaustamente à maioria das editoras – da icónica ULMEIRO, uma das casas legendárias lisboetas e entreposto que foi de passagem de destacadas figuras da cultura lusitana contemporânea. - ns


Dois textos de José Ribeiro

 


ns



   Penso hoje na casa da infância e do que estava perto!

   Em frente a casa dos tios Margarida e Faria e das primas Fernanda, Maria dos Anjos e Talita. Em frente do portão da casa a rua que ia para a fonte da aldeia. Já nessa rua a casa dos vizinhos Bízaros, o ti Anacleto, e os filhos. Nomes? Não chego lá com facilidade. Ao lado direito da nossa casa mais um vizinho em que recordo aquele que emigrou e num regresso meteu o meu pai e os meus tios no seu carro novo para uma viagem em que o carro subiu contra uma oliveira onde morreu o meu pai, nos meus 20/21 anos e nos 58 do pai José Ribeiro. Herdei-lhe o nome e algo mais estou certo! Da mãe fui o único filho que herdou a alcunha, fiquei o Zé Feijão, o filho da Maria Feijoa. Nenhum dos meus irmãos herdou esta alcunha. Para além disso eu era o Zézito para muita gente na aldeia. Essa casa já não existe e em seu lugar está a bonita casa da minha sobrinha Rute. Em frente da casa da minha sobrinha está omnipresente a Capela de Nossa Senhora da Ajuda do séc. XVII.    Esteve sempre lá. Nestas ruas à volta da casa se desenrolavam as nossas brincadeiras: o jogo das escondidas, o jogo do berlinde e do pião, o jogo da bola com meias e trapos, o jogo da malha quando começámos a crescer! Havia depois o cruzeiro do outro lado da capela. Mais para cima da capela ficava a casa do tio Adelino, a casa da avó Jacinta e à esquina da entrada para este pátio havia um alambique onde no inverno se fazia aguardente. Na casa da avó Jacinta também viveu a tia Isaura que tomava conta da capela e que casou com Cristo. Um dia em que vim de férias do seminário dos Dominicanos de Aldeia Nova vim cumprimentá-la com um beijo e ouvi uma espécie de recriminação que ainda hoje ressoa aos meus ouvidos: "não é preciso cá beijos"! E pronto assim fiz depois sempre: aí vai um aperto de mão em nome dos bons costumes e de Deus! Quase em frente da casa da infância mais do lado esquerdo ficava a casa do Diamantino Varão, da sua mãe cozinheira de casamentos e baptizados e do pai que ouvi um dia lá no meu quintal dizer para o filho: " o bacalhau é para quem trabalha!". Assim sem tirar nada...

   Talvez um dia esta ladainha continue por aqui se Nossa Senhora da Ajuda quiser!

                                                             

                                                            *

    Penso nos avós maternos e paternos hoje e não sei bem como aqui cheguei!

    Pelo lado materno o nome da avó era Ana e lembro-me bem dela na vinha a dizer-me que os ovos dos ninhos que estavam nas videiras não eram para tirar porque deles iam nascer novos passarinhos! Do avô materno, de seu nome Teodósio Antunes, sei algumas coisas, a importância de como cozinheiro, sobretudo dos casamentos e baptizados, ter um enorme peso na sobrevivência familiar, mais tarde acho que foi abalroado por uma camioneta e daí ter desaparecido antes do tempo! De qualquer modo lembro-me de estar ao colo dele num local onde hoje está a casa de uma prima e eu teria talvez 2 anos e picos! Sei como eu estava e sei o local exacto onde estava.

   Do lado paterno a avó Jacinta recordo-a na sua casa durante muito anos já depois da morte do meu avô Teodósio Ribeiro, morto na floresta por um raio num dia de tempestade! Visitei muitas vezes a avó na sua casa sempre à lareira. Morreu com mais de 90 anos!

 

 

REFLEXÃO SOBRE LIVROS E AUTORES

 

   Gosto de bons livros. Todos os bons livros, diz ele. O critério para aferir os bons e os maus é sempre subjectivo mesmo para quem escreve do alto da sua cátedra cheio de certezas. O sujeito que escreve vem depois. Pode ser homem ou mulher. Não me interessa o que faz na vida nem se tem o cabelo grande ou curto, se tem ou não tem piercings, nem qual a sua orientação sexual. Pode até ser famoso ou desconhecido.

   Nem sempre um livro que vende muito é bom e um livro que não vende pode ser bom ou mau.

   O sujeito que escreve um livro pode até ser um escroque? Pode. Pode ser uma boa pessoa? Claro, mas nem sempre o é. Por mim prefiro que seja boa pessoa e que escreva bons livros, mas na hora da leitura passo bem sem a sua simpatia. O mundo está cheio de maus tipos que escrevem bem. Por vezes um autor demora anos a ser reconhecido. Muitos morreram antes do reconhecimento. E o mais grave é que muitos morreram na miséria.   Em muitos casos o reconhecimento e o dinheiro chegaram bem mais tarde. Outros (muitos!) jazem já no grande rio do esquecimento.

   Gosto de bons livros, dizia. E o que é um bom livro? Deve alguém que se atreva a escrever dominar os sinais da escrita e organizá-los com a sua própria voz. É na organização dos sinais que se encontra a gramática própria de quem escreve, um caminho próprio, uma arquitectura para o poema ou para o livro. Sem esse trabalho não pode existir um bom livro nem que venda milhões de exemplares. Alguém com presença assídua na televisão só por isso já tem garantido algum sucesso de vendas, mas isso nada acrescenta à qualidade de um livro mesmo que a pessoa saiba piscar bem o olho! A qualidade é o que é!

   Quando Gustave Flaubert publicou a 1ª. ediçao de " L' Éducation Sentimentale" vendeu 150 exemplares. Dez anos depois o mesmo livro vendeu 150.000 exemplares. Mudou alguma coisa nestes dez anos? Sim, alguma coisa mudou, e mudou radicalmente o horizonte de expectativas do leitor em relação a este Autor. Razões para isso acontecer? Se eu soubesse escrevia sobre isso um livro para a posteridade, de preferência um bom livro.

 

(JAR)

 

   (Renomado livreiro e editor da icónica ULMEIRO, José Antunes Ribeiro continua a ser como sempre foi: activo, solidário e atento à Cultura viva na esteira de um mundo mais aberto e fraterno.

   Ao darmos a lume colaboração sua, saudamos a sua postura intemerata que não se deixa vencer pelas dificuldades que nacionalmente se põem à verdadeira gesta que é dar livros à estampa. - ns


Dire Straits, Why worry

 



terça-feira, 21 de junho de 2022

Para que a Terra não esqueça

 


João Garção



Será que sabem fazer mais do que sacudir a água do capote?

 

Serviços do SNS obrigados a fechar por falta de médicos. Milhares de alunos sem professores. Turistas horas à espera de entrar no país. PS governa há seis anos mas a culpa continua a ser dos outros.

É a ironia de uma política que se limitou a aproveitar o bom trabalho do governo anterior, a conjuntura internacional favorável e que foge das reformas como o diabo foge da cruz. Quando se tem como mantra, não resolver os “problemas estruturais” para reforçar a popularidade junto do eleitorado e manter-se no poder a todo o custo, adivinhem o que pode acontecer.

(Dos jornais)

 

    Costa é o grande responsável por tudo o que se está a passar. O homem é incapaz de fazer algo decente pelo país. A única coisa que sabe fazer são joguinhos rasteiros de bastidores e propaganda enganosa. Como gestor do país é um zero absoluto. Diria pior que zero, estará algures abaixo de zero pois nem sequer uma estratégia a 6 meses consegue ter e desenvolver para o país. A única coisa que o move é o benefício pessoal, o poder e consequentemente os votos que o fazem governar ao sabor do vento em plena navegação à vista. Demasiado mau para ser verdade mas apesar de toda a incapacidade até lhe deram uma maioria, terão o que merecem, a cauda da Europa garantida a breve prazo e o consequente empobrecimento do país, o colapso gradual dos serviços públicos e o aumento sistemático da carga fiscal. Viva o Peiésse!

PS - O povo também é tão responsável quanto Costa por tanta ingenuidade e por estar agarrado a políticas dos anos 70 num mundo completamente diferente. 

Luís Martins


Dois poemas de Radovan Ivsic

 




DE TUDO

 

De tudo o que sei

E que eu sei que tu sabes

De tudo o que vejo

De tudo o que ouço

Quando escuto o teu coração

De tudo o que tu me dizes

E que eu tanto amo

De tudo o que acontece

Quando fechas os teus olhos

De todos os sonhos

De todas as estrelas

De todas as nuvens

De tudo isso que sabes

O que me deixa mais feliz ainda?

De tudo isso que me deixa ainda mais feliz

É que eu sei que tu sabes

Porque tu sabes isso e eu também sei

 

Tu sabes que me amas

E eu sei que te amo também.

 

POEMA

 

Ainda que os teus seios sejam flores fugazes

as tuas coxas de erva balançam na minha mão

e os beijos são tão lentos como a claridade

lentos

E eu esqueço o peso e a dor

a tristeza das flores demasiado ao longe

para nos beijarem

e os meus dedos desfolham-se nas tuas espáduas

como se o vento os semeasse e eu morresse de ternura

em toda a parte

e de novo a minha mão corre o teu claro corpo

e os teus seios

que eu acaricio com o meu olho

nu

(Tradução de nicolau saião)


(Publicados anteriormente, pela primeira vez em língua portuguesa, na revista brasileira ACROBATA, inseridos num bloco mais extenso).


Na morte de João Rui de Sousa

 


João Rui de Sousa (12-10-1928 / 17-6-2022)


Os poetas não morrem porque aquilo a que alguns chamam morte é apenas registo civil, nada mais. Num país que conhece Camões pelo olho perdido, Bocage pelas anedotas e Bulhão Pato pelas amêijoas, é tudo relativo, embora de modo absoluto.

João Rui de Sousa estudou agricultura (Curso médio) na Escola Dom Dinis na Paiã (Pontinha). Mais tarde licenciou-se em História e Filosofia pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Estreou-se em 1955 com poemas e um ensaio na Revista «Cassiopeia» ao lado de António Carlos, António Ramos Rosa, José Bento e José Terra.

Tem colaborado em importantes jornais e revistas literárias e tem poemas seus em diversas antologias e volumes colectivos. Publicou estudos sobre as obras poéticas de Adolfo Casais Monteiro, Eugénio de Andrade, José Carlos Gonzalez, Jorge de Sena, Fernando Pessoa e Mário Saa.

Publicou (entre outros) os seguintes livros: «Circulação» (1960), «A hipérbole na cidade» (1060) «A habitação dos dias» (1962) «Meditação em Samos» (1970), «Corpo Terrestre» (1972), «O fogo repartido» (1983), «Palavra azul e quando» (1991), «Enquanto a noite, a folhagem» (1991), «Sonetos de cogitação e êxtase» (1994), «Obstinação do corpo» (1996), «Respirara pela água» (1998), «Concisa instrução aos nautas» (1999) «Os percursos, as estações» (2000), «Obra poética 1960-2000» (2002), «Lavra e pousio» (2005) e «Quarteto para as próximas chuvas» (2008).

Do livro «Respirare attraverso l´acquq» organizado por António Fournier e Alessandro Granata Seixas (Edizioni dell´Orso) citamos dois poemas: primeiro «Agricultura» do livro «Corpo terrestre» (1972): «É preciso recolher as vagens/e dispô-las no chão./ É preciso beijar as plantas/ou cortá-las ao meio. /E ter sempre uma enxada/uma discreta atenção. /ao silêncio da terra/ao calor das abelhas. /Roubar à seara limpa/a planta podre. /e queimar essa planta/em eira aberta. /É preciso a visita do sol/o diálogo da chuva. /É preciso a vertigem da esperança/e esperar com amor. /Descobrir – mais tarde - /a volúpia da rega. /E ser o último a abandonar o campo». O segundo é um excerto do poema inédito até 2014 «Em louvor de Giacomo Leopardi»: «Que significa a vida? Para que serve/ o esforço, a luta, a esperança. O gesto/de desprezo ou de amizade, o estar/ em palco só para que outros vejam/algum possível brilho ou mesmo um escorrer/de oculta petulância, a esconder fraquezas/(que são tantas) da nossa compleição/ tão frágil?»

José do Carmo Francisco    

 

Um adeus alentejano

   Foi com alguma surpresa e absoluta emoção que recebi, de José do Carmo Francisco, a triste notícia do falecimento do poeta e amigo de quem, reiteradamente e através do tempo, recebi diversas manifestações de apreço fraternal – ora através de conversas amenas veiculadas pelo telefone, ora em directo e de viva voz quando em deslocações minhas a Lisboa nos encontrávamos no Café da nossa preferência.

  Foi ele quem me apresentou aos leitores na minha primeira aparição em volume, no caso a antologia “Sete poetas portugueses contemporâneos” editada pela Átrio do comum confrade e amigo José Manuel Capêlo, tendo tido a meu respeito palavras escritas que não me esquecem. Depois, já em voo de cruzeiro - no meu terceiro livro “Os olhares perdidos” – foi ele quem fez a Introdução, perspicaz e competente dada a sua qualidade como ensaísta.

   E colaborou sempre generosamente nas iniciativas em que me cifrei, ou sejam o “Suplemento Cultural” que eu orientava no “Notícias de Elvas ou o “Fanal”, que co-coordenei no “O Distrito de Portalegre”.

   Notável poeta, ensaísta de fina água, crítico arguto e companheiro extremamente afável, relembro-o com saudade agora que partiu com a bela idade de 94 anos. O “velho” abraço, caríssimo confrade João Rui de Sousa!

nicolau saião


Scorpions, Always somewhere

 



terça-feira, 14 de junho de 2022

Para que a Terra não esqueça

 

Líder norte-coreano expressa “total apoio” a Putin


O líder norte-coreano Kim Jong-un manifestou este domingo “total apoio” ao Presidente Vladimir Putin por ocasião do Dia da Rússia, informou a agência de notícias oficial da Coreia do Norte KCNA.

Kim Jong-un enviou uma mensagem de felicitações a Putin e ao povo da Rússia no dia em que se celebra a independência do país, apontou a KCNA.

Sob a liderança de Putin, disse Kim, a Rússia “conseguiu ousadamente ultrapassar todo o tipo de desafios e dificuldades” enfrentados “na realização da justa causa da defesa da dignidade, da segurança e do direito ao desenvolvimento”.

Sem nunca mencionar a guerra na Ucrânia, o líder norte-coreano reafirmou “a amizade entre os dois países”, que “tem sido transmitida através de uma longa história”, revelando ainda vontade de “expandir e desenvolver” essa relação “de acordo com as exigências da nova era e as aspirações dos dois povos”.

(Dos jornais)

 

  Diz-me com quem andas…

  A.Carnide

 

  Outra coisa não seria de esperar... Dois ditadores carniceiros!

 António Afonso

 

  Bernardino Soares também apoia e Jerónimo já tem tudo preparado na festa do Avante. O Museu da Resistência e da Liberdade dirigido por uma comunista (!!!) também deve apoiar...

 Luís Mota


Joaquim Simões, Três disposições

 


ns



Disseste

 

Tudo está bem   a estrela

brilhando para se guiar

o sol que adormece na beirinha do mar

a ave leve sobre a rama

 

agora a chuva

iluminando os silêncios do amor

e em cada gota de riso e suor

um arco-íris a brilhar que nos chama

 

lá do lugar

onde o Tempo se pôs a sonhar

com a história em que se há-de achar

este tempo que foi dado aos dois

e é nossa antes e depois

 

 

Poema ecológico

                             para os do costume

 

De ti, não vemos a cara,

só dás rosto ao rosto infecto

de uma praga, de um insecto

que se espalha pelo país

e nos destrói a raiz,

 

que fala e soa a soneto

que não é branco nem preto,

porque é de bicho-careto.

 

Levas esta versalhada,

não serves para mais nada.

 

 

Sem título

 

Ao perguntar-me, há bocado,

se sonharia, julguei

sentir-me todo encostado

a um eu de um qualquer lado,

de que nunca suspeitei.

 

Como se esse eu fosse alguém

a quem estivesse colado

costas com costas. Porém,

não vi nada nem ninguém,

ao virar-me, admirado.

 

Para o que desse e viesse,

esbracejei à minha volta,

em busca do que pudesse

estar escondido e me quisesse,

alma penada ou à solta.

 

Não sei bem o que me deu,

chamei por ele… por mim…

Mas ninguém me respondeu,

apenas um eco meu

que parecia rir, no fim.

 

Confuso, meio receoso,

pior ainda: irritado,

fiz-lhe caretas de gozo

que, eu cá, nunca fui medroso,

nem estou para ser gozado.

 

Mas nada, nada buliu

perto ou longe dali,

nada chegou ou fugiu

nem se fechou nem se abriu...

Fiquei-me, não insisti.

 

Será que sonhei um sonho?

Não será original

e não chega a ser medonho…

Uns copitos de medronho

e a coisa passa. Afinal...


Aos confrades, amigos, adeptos e simpatizantes

     Devido a um problema informático de última hora, não nos será possível fazer a postagem desta semana.    Esperando resolvê-lo em breve,...