João Rui de Sousa (12-10-1928 /
17-6-2022)
Os
poetas não morrem porque aquilo a que alguns chamam morte é apenas registo
civil, nada mais. Num país que conhece Camões pelo olho perdido, Bocage pelas
anedotas e Bulhão Pato pelas amêijoas, é tudo relativo, embora de modo
absoluto.
João
Rui de Sousa estudou agricultura (Curso médio) na Escola Dom Dinis na Paiã
(Pontinha). Mais tarde licenciou-se em História e Filosofia pela Faculdade de
Letras da Universidade de Lisboa. Estreou-se em 1955 com poemas e um ensaio na
Revista «Cassiopeia» ao lado de António Carlos, António Ramos Rosa, José Bento
e José Terra.
Tem
colaborado em importantes jornais e revistas literárias e tem poemas seus em
diversas antologias e volumes colectivos. Publicou estudos sobre as obras
poéticas de Adolfo Casais Monteiro, Eugénio de Andrade, José Carlos Gonzalez,
Jorge de Sena, Fernando Pessoa e Mário Saa.
Publicou
(entre outros) os seguintes livros: «Circulação» (1960), «A hipérbole na
cidade» (1060) «A habitação dos dias» (1962) «Meditação em Samos» (1970),
«Corpo Terrestre» (1972), «O fogo repartido» (1983), «Palavra azul e quando»
(1991), «Enquanto a noite, a folhagem» (1991), «Sonetos de cogitação e êxtase»
(1994), «Obstinação do corpo» (1996), «Respirara pela água» (1998), «Concisa
instrução aos nautas» (1999) «Os percursos, as estações» (2000), «Obra poética
1960-2000» (2002), «Lavra e pousio» (2005) e «Quarteto para as próximas chuvas»
(2008).
Do
livro «Respirare attraverso l´acquq» organizado por António Fournier e Alessandro
Granata Seixas (Edizioni dell´Orso) citamos dois poemas: primeiro «Agricultura»
do livro «Corpo terrestre» (1972): «É preciso recolher as vagens/e dispô-las no
chão./ É preciso beijar as plantas/ou cortá-las ao meio. /E ter sempre uma
enxada/uma discreta atenção. /ao silêncio da terra/ao calor das abelhas.
/Roubar à seara limpa/a planta podre. /e queimar essa planta/em eira aberta. /É
preciso a visita do sol/o diálogo da chuva. /É preciso a vertigem da
esperança/e esperar com amor. /Descobrir – mais tarde - /a volúpia da rega. /E
ser o último a abandonar o campo». O segundo é um excerto do poema inédito até
2014 «Em louvor de Giacomo Leopardi»: «Que significa a vida? Para que serve/ o
esforço, a luta, a esperança. O gesto/de desprezo ou de amizade, o estar/ em
palco só para que outros vejam/algum possível brilho ou mesmo um escorrer/de
oculta petulância, a esconder fraquezas/(que são tantas) da nossa compleição/
tão frágil?»
José do Carmo Francisco
Um adeus alentejano
Foi com alguma surpresa e absoluta emoção que recebi,
de José do Carmo Francisco, a triste notícia do falecimento do poeta e amigo de
quem, reiteradamente e através do tempo, recebi diversas manifestações de
apreço fraternal – ora através de conversas amenas veiculadas pelo telefone,
ora em directo e de viva voz quando em deslocações minhas a Lisboa nos
encontrávamos no Café da nossa preferência.
Foi ele quem
me apresentou aos leitores na minha primeira aparição em volume, no caso a
antologia “Sete poetas portugueses contemporâneos” editada pela Átrio do comum
confrade e amigo José Manuel Capêlo, tendo tido a meu respeito palavras
escritas que não me esquecem. Depois, já em voo de cruzeiro - no meu terceiro
livro “Os olhares perdidos” – foi ele quem fez a Introdução, perspicaz e
competente dada a sua qualidade como ensaísta.
E colaborou
sempre generosamente nas iniciativas em que me cifrei, ou sejam o “Suplemento Cultural”
que eu orientava no “Notícias de Elvas ou o “Fanal”, que co-coordenei no “O
Distrito de Portalegre”.
Notável
poeta, ensaísta de fina água, crítico arguto e companheiro extremamente afável,
relembro-o com saudade agora que partiu com a bela idade de 94 anos. O “velho”
abraço, caríssimo confrade João Rui de Sousa!
nicolau saião
Sem comentários:
Enviar um comentário