segunda-feira, 24 de abril de 2023

Um poema de João Garção

 




FOTO DE ABRIL

 

O pai chegava tarde…A mãe e os avós

(que o mano era pequeno) estavam sempre comigo.

Então o pai chegava, perguntava da escola

perguntava das coisas que a mãe lhe sussurrava.

 

A escola era a Escola onde eu agora andava.

E a mãe pela manhã falava devagar

arranjava-me o lanche, chamava-lhe merenda

e eu ia no autocarro (sem o mano que tinha)

 

Eu não sabia de anos    só sabia de meses

- o que a mãe me ensinara e que na escola aprendia –

(o mano era pequeno!) eu jogava sozinho.

O pai que vinha tarde não jogava comigo.

 

E o pai que vinha tarde    mesmo se era Domingo

chegou perto da porta na manhã daquele dia.

Havia gente na rua    e gente que gritava

E na televisão     muitos desconhecidos.

 

E o pai depois daquilo     disse-me: anda jogar

Anda jogar meu filho    pois já não há fascismo.

E o pai que vinha tarde jogou comigo à bola

na rua da Amoreira    a rua pequenina

 

E a mãe chorou ao ver-nos    e eu não a entendia

a mãe que era só minha (e do mano que havia)

Eu sabia de meses    mas não sabia de anos

E jogava com o pai    pois já não há fascismo

 

A avó não gritava    Levava-me p’la mão

até ao autocarro    E para a Escolas eu ia

Sozinho ia p’rá Escola (o mano era pequeno…)

- E eu e o pai jogávamos quando eu de lá vinha

 

Jogávamos jogávamos – eu e o pai jogávamos

E o mano (era pequeno!) olhava sentadinho

E a mãe também por vezes nos olhava a jogar

Pois já não há fascismo    Pois já não há fascismo!

 

in “Os versos do Zé Povão”


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