quinta-feira, 20 de janeiro de 2022

Dois poemas de José Carlos Costa Marques


ENQUANTO O DIA BRILHA

 

Lat mig verka mellan dagen brinner.

Carl Milles

 

 

Enquanto o dia brilha – que eu trabalhe.

E brilha tarde o muito longo dia do estio.

Sobre ele não chega quase a cair a escuridão.

Mas dentro nem sempre arde já o mesmo fogo.

 

A obra é tantas vezes sombra e quiçá logro.

A cada dia o tempo encurta a própria vastidão.

A mão por vezes treme e a tesoura o fio

ameaça cortar. Que o corte nos não calhe!

 

Olho para o tempo imaginário que se esvai.

O poente avista-se agora já no horizonte.

A mão já não pode obedecer como inda agora.

 

Porém, o olhar encontra na memória, aonde vai,

o teu olhar sereno – e aí bebe a sua fonte.

Ardendo ainda, em ti pacificado é que ele demora.

 


QUARENTA E SEIS

 

Traz o calor no verão os frutos

Traz o ar tépido memória de uma pátria

O pêssego com sua carne tenra

O melão as graínhas A semente que somos

A pera A maçã com seu perfume antigo

Exalando A casa no verão pousada

E as cerejas vermelhas as cerejas brancas

A cerdeira por sobre o muro nos caminhos

E o morango tão raro O morango

quando o morango era raro As amoras

As amoras no pó da estrada Os figos

com seu ventre aberto sua areia cariciosa

E as bagas sem nome Céu de outras esferas

No verão demoras com os frutos

Amadurece a memória de uma boca

O fruto de uma pátria A pátria de um sabor

De ti que trazes frutos Que és o fruto


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