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Tenho vindo, pelos tempos, a receber de Floriano Martins e ao que creio
em primeira ou quase primeira mão, vários envios com poemas seus ou feitos em
colaboração/co-autoria com poetisas que ele frequenta como confrades ou
correspondentes.
E se é facto que um poema a quatro mãos é sempre compósito, também é
verdade que nestes poemas a que aludo se sente o jeito, a suscitação, diria mesmo a excitação do autor de “Alma
em Chamas” e de outros (nomeadamente um volume de entrevistas, entrevistas
sim, com escritores sul-americanos) que não vou agora citar.
Durante um certo tempo, claramente devido a um enfoque daqueles que
todos os poetas atravessam pelo tempo, na sua caminhada sem norte e sem estrela/ através das tempestades (para
citar Péret) Floriano deu a lume textos de clara vocação imagética, onde o
simbolismo quase barroco (ou o surrealismo na linha de Arcimboldo) se
verificava e se plasmava duma forma evidente, roçando o fantástico na intenção
ou, diria melhor, no resultado.
A seguir, concerteza por ter dominado esses daimóns, sem deixar ela de ser fortemente imaginativa, conciliou-se
– digamo-lo desta forma – com um real, ou trans-real (evidentemente surreal, et pour cause) que apela para o
quotidiano, mas um quotidiano renovado em que as coisas, os momentos, as
lembranças, os seres e os acontecimentos passam a viver intensamente e, nesta
medida, a fazer parte daquilo que considero o seu melhor e mais adequado
timbre.
Aventurando-se naqueles lugares onde outro autor menos seguro e
precavido partiria o pescoço, tem a faculdade de mesclar o sonho com a
realidade, ou diria mesmo (e as suas fotografias a ilustrar os poemas é para aí
claramente que apontam) o retrato do sonho
com o teatro da existência comparticipativa.
Em suma, uma poesia - apesar de carregada de imagens e de conceitos -
cheia de frescura, de invenção e no entanto de justeza.
Uma última palavra, sabendo-se ou intuindo-se, como parece ser
infelizmente hábito na república (ou monarquiazinha?) das letras, que como ele
mesmo afirma em momento de desabafo amargo, as cousas andam escuras (“Sim, o mundo das
letras é um mau tablado, uma gente frequentemente da pior espécie, e note que
não há muita grana ou prestígio circulantes. Fosse assim se matavam entre si a
sol aberto”): é muito agradável e
gratificante, desde logo para os intervenientes, este hacer a quatro manos. Significa, a meu ver, que ainda é possível a
aventura de viver…e de criar sem que os egos se choquem ou as notoriedades se
encarquilhem…
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