quinta-feira, 14 de outubro de 2021

Do meu diário - ns

 


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  Tenho vindo, pelos tempos, a receber de Floriano Martins e ao que creio em primeira ou quase primeira mão, vários envios com poemas seus ou feitos em colaboração/co-autoria com poetisas que ele frequenta como confrades ou correspondentes.

  E se é facto que um poema a quatro mãos é sempre compósito, também é verdade que nestes poemas a que aludo se sente o jeito, a suscitação, diria mesmo a excitação do autor de “Alma em Chamas” e de outros (nomeadamente um volume de entrevistas, entrevistas sim, com escritores sul-americanos) que não vou agora citar.

  Durante um certo tempo, claramente devido a um enfoque daqueles que todos os poetas atravessam pelo tempo, na sua caminhada sem norte e sem estrela/ através das tempestades (para citar Péret) Floriano deu a lume textos de clara vocação imagética, onde o simbolismo quase barroco (ou o surrealismo na linha de Arcimboldo) se verificava e se plasmava duma forma evidente, roçando o fantástico na intenção ou, diria melhor, no resultado.

   A seguir, concerteza por ter dominado esses daimóns, sem deixar ela de ser fortemente imaginativa, conciliou-se – digamo-lo desta forma – com um real, ou trans-real (evidentemente surreal, et pour cause) que apela para o quotidiano, mas um quotidiano renovado em que as coisas, os momentos, as lembranças, os seres e os acontecimentos passam a viver intensamente e, nesta medida, a fazer parte daquilo que considero o seu melhor e mais adequado timbre.

  Aventurando-se naqueles lugares onde outro autor menos seguro e precavido partiria o pescoço, tem a faculdade de mesclar o sonho com a realidade, ou diria mesmo (e as suas fotografias a ilustrar os poemas é para aí claramente que apontam) o retrato do sonho com o teatro da existência comparticipativa.

   Em suma, uma poesia - apesar de carregada de imagens e de conceitos - cheia de frescura, de invenção e no entanto de justeza.

   Uma última palavra, sabendo-se ou intuindo-se, como parece ser infelizmente hábito na república (ou monarquiazinha?) das letras, que como ele mesmo afirma em momento de desabafo amargo, as cousas andam escuras (“Sim, o mundo das letras é um mau tablado, uma gente frequentemente da pior espécie, e note que não há muita grana ou prestígio circulantes. Fosse assim se matavam entre si a sol aberto”): é muito agradável e gratificante, desde logo para os intervenientes, este hacer a quatro manos. Significa, a meu ver, que ainda é possível a aventura de viver…e de criar sem que os egos se choquem ou as notoriedades se encarquilhem…


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