PEDAGOGIA
DEMOCRÁTICA
“- A questão – disse Alice – está em saber se tu podes fazer com que as
palavras tenham o sentido
que tu desejas que tenham.
- A
questão está em saber quem é que manda – retorquiu Humpty Dumpty”
Lewis Carrol in “Alice no outro lado do espelho”
ns
DETRÁS DA CORTINA – A Contra Informação
Subsídios para um conhecimento
“A
contra-ínformação consiste na arte de fazer do preto branco e do branco
preto…e vice-versa”
Jacques
Bergier
“Uma imaginação muito viva
reduz tudo a uma brincadeira de crianças”
Sir Charles Belfrage
Introdução
Winston Churchill disse um dia, no decorrer
dum debate parlamentar, que a política era a
arte de através de conceitos acertados fazer previsões adequadas e, depois,
conseguir explicar bem porque é que tudo falhou…
Pois bem. Em traços largos, a
contra-informação é a “técnica artística”
de justificar, explicar, esbater, transformar e melhorar os factos desse
falhanço, levando a população, ou determinados sectores dela, a considerar que
os acontecimentos, afinal, traziam dentro deles um confirmável sucesso
possibilitado pelas qualidades de quem os pôs a correr, ou seja os seus
fautores, em geral governantes ou operadores públicos de topo.
Antes de passarmos a considerar os vários
continentes em que se exerce a contra-informação (laica, fideísta, oficial e
oficiosa, departamental ou global, etc.) interessa definir os tipos sociais que
a configuram: legítima ou ilegítima, governamental e particular (nos diversos
ramos societários: científicos, desportivos, artísticos, económicos e
industriais – uma vez que a partir dos princípios do século vinte a
contra-informação se sofisticou, desenvolveu e plurifacetou, não só devido à
expansão dos meios existentes como à criação de outros – jornais de grande
tiragem, rádios com apelo nacional, cinema, televisão e, por último, o universo
interactivo.
Em suma: os meios que possibilitam a
manipulação quase instantânea do consciente
e do inconsciente colectivo, que é o
mundo para o qual a contra-informação aponta. Pois a contra-informação é antes de mais, nua e cruamente e como diria
Importa referir, desde já, que por vezes se
confunde (deliberadamente ou não) contra-informação
com propaganda ou, mesmo, com publicidade. (Um género específico e
peculiar de publicidade, de ideias ou de meios para as atingir). Evidentemente
que se em certos aspectos se interpenetram nalgumas franjas, são de índole
totalmente diferente.
No que respeita ao segundo íten isso deve-se
ao facto de que a cimentação do marketing
(ponto social de grande relevo) e de todas as técnicas (ou truques) que o
acompanham, pode em certos casos servir para operações de fases da
contra-informação. Mas isso são detalhes laterais que ao longo desta exposição
ficarão, creio, aclarados.
Penso que deverei dizer, ainda, que o mundo
da contra-informação – e refiro-me agora e somente à contra-informação oficial, classifiquemo-la desta maneira
- assim como o da sua análise, do seu estudo, da sua frequentação enquanto
matéria avaliada e que parte de uma realidade insofismável, é extenso, complexo
e até extremamente apelativo.
Deixa-nos, depois de nele entrarmos para
escrutiná-lo, uma sensação de que o espelho da existência está doravante mais
iluminado, ainda que simultaneamente fique muito mais inquietante: sente-se
mesmo, por vezes, uma sensação de medo,
pois o contacto com os verdadeiros meandros pelos quais se move o Poder e os
seus áulicos, donos de nós todos porque donos das sociedades organizadas, pode
ser assustador e durante alguns segundos pelo menos receia-se perder o pé. (Não era por acaso que nos
regimes totalitários o cidadão vulgar não podia debruçar-se sobre o universo da
contra-informação, sob pena de prisão no mínimo, dado que tais matérias eram secretas ou, no melhor dos casos,
bastante reservadas por razões que
será desnecessário salientar. Mesmo nas sociedades democráticas por extenso, ou
tendencialmente democráticas como a
lusitana, tais matérias não são bem-vindas à colação, uma vez que permitem
divisar a abertura do jogo em que os
dignitários se acobertam, elite que são e das mais privilegiadas).
Por outro lado, hoje é pacífico que nenhuma
formação partidária ou de intervenção pública deixa de ter uma task force de contra-informação, mesmo
pequena e ainda que muitas delas sejam simplesmente amadoras ou dependendo da
chamada prata da casa com algumas
leituras ou contactos, emergindo mais da frequentação eventual de acervos
aparentemente conhecedores do que dum conhecimento sistematizado.
Finalmente, deverá salientar-se que se a
contra-informação oficial fôr tratada pelos seus operadores de forma digna,
democrática e cívica, poderá prestar altos serviços às nações onde estes se
inserem. Mas infelizmente as classes dominantes com frequência entendem
utilizá-la preferencialmente para trasfegarem os seus jogos de influência, quantas vezes sórdidos ou pouco transparentes,
submetendo os cidadãos a verdadeiras lavagens ao cérebro, tratando-os como
mentecaptos ou como primários – o que desenha perfeitamente a efígie com que,
no entanto, aqueles tentam posicionar-se para a História.
“Eu nunca minto, a não
ser que seja absolutamente necessário”
G.K. Chesterton
Quem não conhece a famosa cena da série televisiva “Missão Impossível” em que numa gravação
é dito por uma voz anónima para o comandante da task force, depois da designação das tarefas a efectuar e antes da
fita áudio se auto-destruir: “Se decidir
aceitar a missão, Jim, tenha em conta que se algo correr mal o Secretário de
Estado negará tudo”?.
Isto é um dado proveniente duma das regras
da contra-informação: lançar-se um véu sobre acções programadas, que
evidentemente não existem. Cabe aos operacionais, através da escrita ou de
outro meio similar, mostrar essa evidência (assim como, noutro plano menos
amável, lhes cabe desmentir eficazmente conluios, actos ilegais, manigâncias e
outras amenidades das entidades que devem “proteger”,
servindo-lhes de anteparo racional).
Esclareço desde já que nenhum mal haveria
nestas regras, nestes procedimentos – desde que o que estivesse em causa fosse
uma actuação para defender a liberdade democrática e a civilização humanista. O
campo da “struggle under cover”, ou
na expressão lusa “luta nas sombras”
não é propriamente um relvado desportivo,
mas sim um terreno vago, muitas vezes
mal frequentado, onde se joga frequentemente o futuro de populações ou de
conceitos e práticas existenciais.
Haja em vista, por exemplo, o belíssimo
trabalho que as equipas de contra-informação desempenharam na luta contra o
nazismo e outros totalitarismos, já defuntos ou entretanto emergidos, ou contra
o crime organizado. A este propósito veja-se que até a Máfia possuía/possui
grupos e palavras de ordem contra-informativas, que estabeleciam slogans e conceitos
defensivos-manipulatórios de inegável êxito como o célebre “A Máfia não existe, é uma invenção dos
jornais e da polícia” ou o actual “Já
não actuam através de meios violentos”…
De uma maneira geral podemos considerar que
(apesar de dum modo mais ou menos ingénuo ou titubeante a contra-informação
existir há centenas de anos e ser usada por mentores religiosos, entidades
reinantes ou chefes guerreiros) modernamente e duma forma consistente oficial
e/ou estatal estabeleceu-se com eficácia
e boa operacionalidade por volta de 1860 em França com Napoleão III e na
Alemanha com o chanceler Bismarck (o criador do depois famoso “Fundo dos Répteis”, robusta verba
secreta com que estipendiava publicistas venais, o que mais tarde seria norma
bem assente em geral, clássica, em qualquer lado).
Até aí, uma vez que a propaganda era fundamentalmente de tipo pessoal, festejando em
regra as capacidades do monarca ou do chefe (como em relação a Luís XIV ou ao
general Boulanger), a contra-informação a ela ligada era apenas de tipo
fragmentário, eventual e muitas vezes mais utilizada pelos membros da
espionagem que pelos operadores especializados na sua retórica peculiar que em
seguida se formariam e iriam ter uma função própria e bem determinada e que
afinal só por ligeira osmose tem a ver com os agentes de “cloak and dagger”, ou seja “de
capa e espada” na gíria do milieu.
Em vez de serem grandes possuidores de
potentes atributos musculares e alta desenvoltura física, os operacionais da
contra-informação dispõem sim de inegáveis qualidades intelectuais e de uma
cultura razoável que lhes permita articular as denominadas “jogadas”, desta ou daquela índole,
possibilitando-lhes dar seguimento eficiente às “manipulações” necessárias para determinados fins considerados
satisfatórios ou imprescindíveis. Porque, se a contra-informação se norteia por
regras e manejos muito próprios, também é fortemente fecundada, quando calha,
por “ideias luminosas” deste ou aquele profissional (ou amador dotado…) como
sucedeu no caso do célebre “envelope
canadiano” com que um par de advogados ardilosos, operando nas faldas do
Partido Republicano pré-nixoniano, num lance bem manobrado deram cabo num ápice
duma candidatura dos rivais democráticos.
Eis como se explica que muitos operacionais
da contra-informação sejam recrutados nos estabelecimentos de ensino, ou entre
cultores e artistas da palavra, etc. Curiosamente, poucos provêm dos meios
jornalísticos, sendo que é mais usual a esses especialistas efectuarem
habilmente nesses meios as suas “plantações”
através dos chamados “tiros ao lado”,
“fontes localizadas e/ou bem informadas”, “observadores fidedignos” etc.
É voz corrente que autores de qualidade como
Somerset Maugham, Ian Fleming, John Le Carré, etc. foram eficazes e competentes
membros do sector da contra-informação no seu país natal.
Os exemplos poderiam aliás multiplicar-se
vindos de outras nacionalidades.
“Ninguém precisa dos mortos”
Bryan
Forbes
As acções de contra-informação exercem-se
porque existe um público do outro lado que ou está atento aos acontecimentos
nas diversas áreas societárias (políticos, económicos, científicos, fideístas)
ou, não o estando ainda, é susceptível de disponibilidade uma vez para eles
chamada a sua atenção mesmo que de forma especiosa, forjando-se um movimento de
simpatia ou de recuo conforme as acções sejam activas ou reactivas.
Assim sendo, é necessário analisar-se
argutamente esse público, perscrutando as suas características conformativas: grau cultural, preconceitos ou tendências,
nível de exigência ética ou humana, capacidade de empenhamento, etc.
Em seguida, estudar-se a forma de
confeccionar um discurso apelativo, facilmente reconhecível para que haja uma
boa adesão, moldável mas nunca integralmente falso ou desbocado (não deve nunca
descer às injúrias, como é de uso estar a suceder nos tempos já interactivos
modernos em fóruns ou espaços afins, aliás geralmente ineficazes ou sem
qualidade), nem arvorar violências verbais desbragadas (que o público em geral
não partilha ou de que não gosta). Esse discurso quase credível deve ser
conformado ora por pequenas nuances,
pequenos detalhes habilmente distorcidos mas partindo de bases reais, ora
discretamente repetidos (técnica da lente
de aumentar), ora vindos das razões do adversário, mas modificados e
moldados como num reflexo (técnica da imagem
no espelho ou da inversão).
Em toda este verdadeiro rol de situações
específicas, os contra-informadores competentes nunca perdem de vista o
contexto em que os factos estão integrados, o seu timing e a sua possível eficiência e operacionalidade. Muitas
tiradas contra-informativas até usam aparecer em público travestidas de trechos
analíticos cinéfilos, desportivos, de sociedade…
Basta lembrarmo-nos do que sucedia nos
tempos da segunda guerra mundial, ou nos tempos da guerra fria, ou nos da
actual détante ocidental vigiada de
perto pelo fanatismo islâmico - e ficará feita a constatação.
Em suma: a contra-informação competente,
sendo activa, cria um ambiente
massivo favorável à eventual propaganda que
se lhe segue, imediata ou mais
espaçadamente (por vezes é necessário que certas ideias ou conceitos sedimentem
suficientemente, para ficarem melhor incrustados nas cabeças dos alvos a manipular com intuitos
salvíficos ou maléficos). Sendo reactiva,
pode conseguir rasurar de forma capaz situações de risco propiciadas por
dirigentes relapsos ou por dificuldades legítimas no mundo da confrontação
entre estados.
Como corolário, conclua-se que existem bons
e eficazes serviços de contra-informação (não estamos, obviamente, a
referir-nos à sua bondade social, mas
à sua qualidade operativa). Os da
ICAR são um exemplo positivo, tanto mais que têm a vantagem de ser servidos
pelas características e afinidades do seu público mapeável. Outros serviços
mais ou menos exemplares: os britânicos, cuja experiência vivificada pela
grande confrontação mundial contra os nazis e as forças de leste nunca se viu
irrevogavelmente posta
No que aos soviéticos respeitava, se em
certos campos, principalmente da propaganda tout
court, conseguiam resultados muito razoáveis, ajudados aliás pelos adeptos
das suas doutrinas vivendo no Ocidente, a nível de contra-informação viam-se
limitados pela retórica matraqueante
dessa mesma doutrina, que internamente era algo ineficaz e pouco credível
porque confrontada pelas realidades que os cidadãos viviam quotidianamente.
Nos países islâmicos a contra-informação é
praticamente inexistente enquanto disciplina
reservada, tendo sido substituída ou tendo sempre existido sob a feição de
discurso intensivo feito a partir das doutrinas religiosas que os
enformam.
Em conclusão: a contra-informação sempre
foi um dado que explicava muito razoavelmente uma certa sociedade, uma certa
maneira de viver, um certo continente existencial se observado com alguma
penetração.
Nos nossos dias, o que não deixa de ser, e
é mesmo, absolutamente significativo e muito característico duma sociedade que
vive sob os signos mediático e interactivo, a contra-informação que conseguímos
detectar (uma vez que os sigilos reais e perfeitamente afastados do homem comum
controlados pelos condutores da coisa
pública e da casta de topo são indubitáveis) ela começa a ser a dona e
senhora de um certo ambiente, de uma certa quotidianeidade, de uma certa
existência social.
Um algo inquietante “estado de normalidade”, como muito apropriadamente escreveu no
TriploV Maria Estela Guedes?
Franca e sinceramente, eu não levantaria
voz nem figura para formular expressão diferente ou para discordar!
PEQUENO MANUAL DE CONTRA-INFORMAÇÃO
Ao elaborar este pequeno e
resumido manual para uso prático, contendo apenas as linhas gerais mas que
permitem, se necessário, praticar contra-informação com conhecimento de causa
e, ao mesmo tempo, ficar-se habilitado a ver claro a do oponente, devo dizer
antes de mais que quem quiser entrar e sentar-se nele como um educado
cavalheiro, ou educada dama, se continuar a ler é melhor perder as ilusões …
Efectivamente, os leitores – geralmente pequeno número de confrades de
confiança ou eventuais futuros membros de task force, ainda que apenas suposta para efeitos de léxico comum – devem
perceber que acabaram de entrar como espectadores/visitantes no continente dos golpes
baixos, do trabalho sujo, da deliberada simulação operacional.
Em
contra-informação a moral não rende nem paga a pena, a não ser que, por
hipótese, ela permita afivelar uma maior eficácia. Ou uso democrático, leia-se
anti-regime totalitário.
Um
manual praticado de contra-informação é a assumpção da fille-d’autre mère bem sucedida, que deve obviamente
creditar-se como a “maior moralidade”, a “maior ética”, o mais justo desempenho.
O que conta, nela, é aniquilar o adversário, de preferência ao primeiro golpe.
O segundo golpe só é de desejar se, mediante o mesmo, se conseguir destroçar um
punhado mais de adversários ou preparar o campo para mais eficazes futuras
hecatombes. Em contra-informação os fins justificam os meios, a não ser que
esses meios corram o risco de ficar excessivamente expostos.
Como consolação, haja em vista que mediante o estudo prático deste
assunto se incrementa a liberdade democrática, que é filha do conhecimento, que
os membros do poder usam geralmente, pelo contrário, para destroçar o bem
comum.
Tal
como no famoso tomo de Machiavelli, aqui ao fim e ao cabo alerta-se o cidadão
para as realidades, permitindo-lhe entender as ciladas.
Os
operacionais, é claro, não precisam de as ler.
Nunca esquecer que, como disse Salazar (um excelente e talentoso
hipócrita), “em política o que parece, é”.
Será necessário dizer que em contra-informação é exactamente a mesma coisa?
Não
esquecer também que uma contra-informação eficaz pode ajustar-se
preferencialmente se apoiada em meios societários favoráveis: sistema judicial
parcialmente corrompido ou corruptível dum ponto de vista ético, forças de
segurança lábeis ou venais, operadores mídias passíveis de estipêndio, etc…
Os
objectivos – bem como as acções sequentes - devem pois trabalhar-se caso a caso
e com índices seguros. Nunca contar com as chamadas “expectativas de
milagre”.
Isso irá evitar tropeções aos operacionais.
Primeira parte
1. As Técnicas contra-informativas
temporais
São elas: imediatas, a curto, a médio e
a longo prazo.
As imediatas visam responder quando o objecto de protecção ou operador de topo fica subitamente
exposto, ou quando uma situação emergente
é despoletada.
a)
o desmentido
(deve usar-se com rapidez, haja ou não razões para desmentir). O seu objectivo
é, primeiro que tudo, ganhar tempo.
b)
A declaração
de próxima emissão de comunicado. Permite gerar uma certa expectativa, além de
que os factos posteriores podem contorná-la. E só se emitirá o comunicado se
esses factos não o tornarem desnecessário por entretanto as condições terem
mudado.
c)
A remissão de
declarações para um outro emissor, de preferência ausente do núcleo duro. Cria
confusão nos receptores.
d)
A postura frontal.
Se for pedido ao protagonista um número, tentando confundi-lo pela incapacidade
de o ter à mão, aventar um qualquer que possa parecer minimamente credível,
visto haver sempre a possibilidade de rectificar posteriormente ou alegar má-fé
na transcrição, além de que o grande público é desatento e mal formado (o que
lhe interessa é a aparência palpitante, não a verdade dos factos).
e) A resposta paralela. Exemplificando: “Por agora, o meu comentário é que só falta
que me acusem de que também fiz o Benfica perder em Alvalade ou que afundei o
Titanic”. Não diz nada e o povo usa capear-se pela referência a um clube
popular ou um caso histórico mediático primário. Como se sabe, a (in)capacidade
de apreensão não é muito grande e liga preferencialmente ao acessório
espectacular. (O falar-se por exemplo em
robalos, detalhe risível aventado para possibilitar um tom anedótico no meio
dum facto grave).
A curto
prazo:
a) a técnica do porco com óculos ou do primo fino. Declaração, usualmente
infirmativa, lida ou prestada por um assecla com boa imagem ou com autoridade moral (sic). Nunca ir ao
fundo da questão, mas recortar generalidades entremeadas de vagas e
dissimuladas ameaças. Permite, nos casos mais eficazes, encolerizar o oponente
e fazer-lhe perder tempo a recolocar os dados do assunto em apreço.
b) a técnica dos
tenores. Duas ou três personalidades
próximas referirem o assunto ou como um absurdo ou como um dado adquirido,
conforme os casos, seguindo-se imediatamente declaração corroborando, mas feita
como se não tivesse directa ligação.
c) a técnica do bilhete amoroso, comunicado enviado aos
jornais, que obviamente só na próxima edição o farão sair e no qual os factos
são apresentados como se tudo fosse evidente. Aqui, nunca dar indicativos
falsos, mas apontar as falsidades (reais ou presuntivas) do oponente. Assim se
lança a dúvida, que posteriormente pode ser aproveitada para tripudiar ou
macerar.
d) a técnica do tiro ao lado. Chama-se à colação um
detalhe ou caso realçado que desvie as atenções do fundamental. (Falar-se em eventuais escutas ao próprio
eventual alto magistrado, desviando assim as atenções da crítica justificada de
haver compadrio ou desleixo em delegações de promotoria).
A médio prazo:
a) a técnica do bom gigante. Artigo presumivelmente ou
preferentemente da autoria de especialista respeitável,
mostrando com soma de pormenores a razão que assiste ao objecto exposto. Daí
que devam sempre ter-se alguns operadores com notoriedade pré-fabricada (ou
vedetas com bom paladar) para dar credibilidade ao tema. O populacho, mesmo
aparentemente culto ou não provinciano, é muito sensível a esses áulicos. (O defunto EPC foi um dos mais notórios,
assinalado pelo professor da Sorbonne e da Univ. de Abidjan André Coyné,
ensaísta e companheiro de André Breton, num
livro editado por Lima de Freitas).
b) a técnica do engate ou do sr. prior. Convidar-se um idiota útil do campo neutro ou mesmo
contrário e, com o pretexto da democraticidade, conseguir ou um artigo ou uma
entrevista em que, sem dizer mal, é capciosamente objecto de uma ou duas
perguntas dissimuladas que, depois, permitem estabelecer uma tese no mínimo
dubidativa. (As chamadas personalidades
ou famosos do sector artístico ou desportivo são geralmente um campo fértil
para o operacional trabalhar.).
c) a técnica da tourada ou da puta espanhola. Mesa
redonda ou debate, onde um idiota útil e um assecla fazem as despesas da defesa
e simultaneamente do ataque. Nunca hostilizar e muito menos ofender o
adversário, mas sim ajudar o público a reflectir (pois o público reflecte pouco, ajudado reflecte melhor…).
d) a técnica do fardo de palha, baseada no ditado de
que todo o burro come palha, o que é
preciso é saber-se dar-lha. Entrevista ou programa género um dia com o objecto. Humaniza o dito,
possibilita-lhe boa performance, tanto mais que a matéria é editada e tratada.
Responde à curiosidade latente no poviléu. (O
actual premier é perito na utilização desta técnica).
e) a técnica do tio da América ou da herança milionária. Momento presuntivo
de apresentação de assuntos efectuada por áulico (de ataque ou de defesa) mas
sendo no entanto matéria contra-informativa clássica propiciada por um comparsa
que simula interrogar mas apenas serve de introdutor. (O notório MRS é um dos mais capazes neste género de manipulação, a
que chamam análise ou comentarismo. As suas intervenções são caracterizadas por
um eficacíssimo cinismo).
A longo prazo:
a) técnica do bom irmão. Livro ou opúsculo com boa
soma de informações sobre as razões do objecto. Visa em geral ser um detalhe de propaganda.
b) técnica do santo venerável. Geralmente biografia,
em livro ou opúsculo, apontando para as qualidades com esbatimento de defeitos,
do objecto. (Exemplos: “Sócrates, o
menino de oiro do PS”, “Força, força,
companheiro Vasco”, título a partir duma canção militante. As hagiografias
da ICAR, geralmente controladas ou revistas por operacionais competentes da
hierarquia ou agentes da Sodalitium Pianum, serviços secretos da dita
entidade).
***
Bibliografia de base:
A escola dos ditadores – Ignazio Silone
A informação – Fernand Terrou
A caçada sem fim – Bryan Forbes
O terceiro Reich visto por dentro – Albert
Speer
A propaganda política – Jean-Marie
Domenach
El medio media – Lorenzo Gomis
Ofício de espião – Allen Dulles
Eu não sou uma lenda – Jacques Bergier
História da minha vida – Sir Winston
Churchill
Páginas do meu Diário nos meus tempos de
operacional – ns
ns
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