quinta-feira, 24 de setembro de 2020

In memoriam de Manuel Hermínio Monteiro - Um poema seu

 




António Maria Lisboa

 

Senhora mãe é uma escadaria de costas para o poente

as mãos no peito, “as mamas na varanda”.

No passe-vite, nos brinquedos do menino

na fome do menino

Senhora mãe vai esmigalhando deus e o diabo

pela tarde fora

pelo silêncio adentro.

 

Um pardal poisa em frente ao sol do poema

vem do Norte

vem de trás do tempo

na Senhora mãe o pardal goteja

a loucura inominada

do nome das casas

um pardal de erva submete a primavera

em Novembro, Senhora mãe,

um pardal sem choro semeia o vendaval

                 parte vidros

                 sorri atrás da porta

                 chupa-te os dedos Senhora mãe

aniquila no teu vestido vermelho

o teu palácio apocalíptico

o teu silêncio de mina

as serpentinas de arame

nos teus olhos de escadaria

batendo maternalmente no poema

que um poema

é maior que um filho penteado.


Enviado a NS em Dezembro de 80, foi por este dado a lume posteriormente na Página Literária do semanário alentejano “A Rabeca”, que orientava.

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