quinta-feira, 11 de junho de 2020

Do zero ao infinito


ns, Cartão para tapeçaria


Palavras proferidas na inauguração da Exposição “Do zero ao infinito”


   Nesta breve intervenção, depois de saudar todos os funcionários desta Galeria e os visitantes que se dignam participar na abertura da mostra, gostaria de começar por uma citação de um dos autores nucleares do nosso tempo, Ernest Bloch. Disse ele que “Sem as ruas interiores do espírito não é possível transitar erguidos e com dignidade pelas ruas exteriores do mundo”.
    Já lá vai o tempo - embora os próceres que tal defendiam ainda não tenham desaparecido de todo - em que se tentava estabelecer a ideia errada de que um acto cultural não passava de um evento mais ou menos dispensável ou, na melhor das hipóteses, uma espécie de vernissage para acatitar momentos de ócio ou de propaganda.
   Uma sociedade civilizada que assim se comportasse dificilmente poderia usar esse nome. Na verdade, conforme referiu Juan Ramón Jimenez numa carta a sua mulher Zenóbia, a cultura e a arte defendem-nos da morte, bem como do opróbrio e da exaustão interior.
   Vivemos neste momento sob os ecos da acção que crismou este mês como um núcleo de incrementação da paz, isto a nível mundial conforme até o secretário-geral da ONU deu notícia há pouco tempo atrás.
    Gostaria de assinalar, a este propósito, que a arte autêntica, bem como a cultura autêntica (ou seja, as que não dependem de humores, mais ou menos de desconfiar, dos chamados poderosos do momento) são sempre propostas de paz – uma vez que a paz interior, consubstanciada nos produtos do artista, se projecta na paz exterior. E é por isso que a Paz, a grande paz dos povos como lhe chamou Sto. Agostinho, não pode depender de violentos nem dos que propiciam arbitrariedades. Parafraseando o filósofo Jean Guitton, a vida plena, da qual a paz é o sinal mais relevante, não se constrói com gente equívoca. Ou, como referiu tempo atrás Manuel Caldeira, a paz não se alcança com burlões, com perseguidores que pelos tempos se serviram de manejos para violentarem consciências através da mentira e da iniquidade.
    Mas se a cultura e a arte propõem a paz, igualmente propõem outros altos valores do espírito, duma forma autêntica e descomprometida. E é por isso que os artistas conscientes dum ponto de vista cultural e ético não podem pactuar com défices democráticos que alguns ainda tentam estimular nos representantes populares, com a censura, com a discriminação ou com quaisquer procedimentos antidemocráticos e liberticidas, ainda que se disfarcem de humanistas. Nesta medida, creio que fará fecundo sentido recordar que foram iniciadas, a nível mundial, acções tendentes a fazer crescer, duma forma sustentada, o civismo, a ética e a cidadania. Que se contrapõem aos tentames da simpes propaganda tendenciosa, ideologicamente baseada em autoritarismos cínicos.
    Porque é para esses valores, consubstanciados nas tais ruas interiores que se projectam no mundo exterior, que aponta a Arte autêntica e todos aqueles que a executam.
    Muito obrigado pela vossa presença.
                                                                                                          ns

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