Estava eu no norte
do país e queria sair da Cidade* em direcção ao Porto sem me enganar na
estrada. Como gosto de olhar para as coisas, claro que me enganei. Fui dar, sem
má consciência, a Serzedelo.
Fica prá
direita, prá esquerda? Sei lá, mas foi ali que eu deslindei um mistério. Ao
passar por uma rua apertada que precedia um largo divisei numa parede uma
inscrição a tinta que me chamou a atenção e me informou utilmente. Dizia:
"Amo-te, Isabel!".
Era então ali que a Isabel morava! Que
mora. A Isabel nortenha dos negros olhos pestanudos que todos conhecemos.
E eu parece-me que sei, Isabel, quem te
interpelou assim publicamente. Ou eu muito me engano ou foi aquele rapaz um
pouco calado - sim, o que tem um pé ligeiramente de lado e o nariz algo torcido
- que uma vez ao passar por ti junto a um café se desviou logo para tu
entrares. Por um momento o vosso olhar cruzou-se e tu durante dois dias ficaste
a meditar, que o moço apesar do pé e do nariz tem olhos sensíveis, bons braços
de trabalhador (é empregado num armazém de pneus) e uma expressão prometedora.
E eu digo-te, Isabel: agarra-o com as
duas mãos. Assalta um casino, um comboio correio. Ou vende as arrecadas que os
parentes te deram. Paga a operação ao moço, que ele merece. E até pode ser que
gostes do pé de lado. E do nariz torcido. E diz-lhe que leste a mensagem. Um
tipo capaz de arriscar assim a reputação publicamente não pode deixar de ser um
sujeito de carácter. E gostar de ti deveras.
Dá-te pressa. Põe sebo nas canelas -
que tens bem harmoniosas e roliças.
Aproveita, que coisas destas não aparecem duas vezes numa eternidade!
*Geralmente, em Portugal chama-se assim a Guimarães, que foi onde nasceu
a nacionalidade.
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