Aconchego
Na
luz vivem dez mil tons
No
ar moram dez mil sons
Nos
corpos dez mil odores
Rodam
com dez mil sabores
Num
torvelinho que vejo
Ouço
cheiro provo desejo
Ora
o verso ora o reverso
Dos
prazeres e das dores
Em
que ensaio os meus amores
Roda-viva
Universo
Entre
a fortuna e a má-sorte
Entre
o nascimento e a morte
Onde
às vezes espreita um verso
Que
aconchego ao coração
P´ra
que ele o faça canção
Poema incompleto
(para
Lúcia Helena Weiss)
Nunca
caias em certezas:
Diz,
de tudo, que parece.
Aquilo
a que chamas mundo,
É
o que, em ti, acontece.
Estranha-te,
se ainda és jovem;
Estranha-te,
se já fores velho.
Estranha
sempre o que vires,
Quando
te vires ao espelho.
Estranha
os olhos, estranha os dedos,
Estranha
a fome, o respirares…
E,
se ansiares pelo voo,
Estranha
as asas e os ares.
Estranha
a voz, estranha o falar,
O
que dizem natural,
Estranha
o teres que estranhar
Tudo
o que é habitual.
Estranha,
estranha o porquê,
O
isto, agora e aqui.
Só
quando nada for teu
Terás
a verdade em ti.
Porque
a verdade é vazio
Sem
tempo, forma nem cor.
Mas
não é paz indiferente:
É
a presença do Amor.
Andando
Vou andando, passo a
passo.
A cada passo que dou
passa o tempo, ao mesmo
tempo,
a ser tempo que passou.
Desfaço a passada, torno
à primeira posição:
a perna voltou atrás,
mas o tempo, esse, não.
Atrás de mim, vejo o
tempo
no espaço que foi
ficando:
o mundo é como o rasto
do tempo que vai andando.
Em meu redor está o mundo
que alguém fez antes de mim.
Não sei onde começou
nem consigo achar-lhe o
fim.
Espaço, tempo, tempo,
espaço…!
No meu corpo, em todo o
lado!
E o coração torna o tempo
mais ou menos apressado.
Há mais mundo, a cada vez
que o meu pé pousa no
chão…
O tempo parece gente
no bater do coração…
E o som do pé, quando
bate
ao ritmo que vai no
peito,
faz ouvir, cá fora, o
mundo
que quer ser tempo
perfeito.
Talvez, se eu estiver à
escuta
enquanto for caminhando,
possa fazer, acordado,
o tempo que vou sonhando.
Descobrimentos
(para
Lúcia Helena Weiss)
Difundir
o corpo
na
toalha
da
calma
Deixar
que o silêncio
se
dissolva
na
alma
Degustar
as flores
que
se abrem
num
grito
–
Terra nova à vista?
–
Não, meu capitão,
só
o infinito.
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