segunda-feira, 6 de setembro de 2021

Dois poemas de Carlos Alvarez

 


ns, O lobisomem



Canção do pescador


As redes tenho-as eu cheias

(mas as mãos estão vazias)

Que as redes são do meu amo

e as mãos são minhas.

 

Que deserto estava o mar

debaixo do anoitecer!

Com o seu suor o enchem

os que no mar vão morrer.

 

E que escuro estava o campo

hoje pela madrugada!

Com estas mãos chamaremos

toda a luz da alvorada.

 

Quando terás tu a terra

e o mar por pão?

Tuas as barcas e as redes

firmes na mão?

 


Poema

 

As árvores contemplam-me; os pirilampos

dissimulam a  luz quando caminho

e o murmúrio inocente do regato

exprime-se a meia voz e esconde-me algo.

Os vastos pedregais, o fugitivo

espírito do vento, tudo

transforma o seu tamanho, tudo

se transfigura quando passo

- na mão que me denuncia

na voz que me assinala.

Já o sabem

os que açulam os cães, os que preparam

o meu pescoço para o laço de mil nós.

E na forja o ferreiro põe à prova

contra mim a sua arte…os vagarosos muros…

o poço aonde um ciclope invisível

vigiará os meus gestos encadeados…

 

Porque no fundo obscuro do espelho

não vi só o meu rosto   ao desnudar-se

quando à noite me olhei;

nele não estavam só

o meu golpe de garra e o seu uivo de gozo

a deleitar-se co’a intriga: um olhar de susto

recordo que também ali havia

e uma rápida fuga

que me cobriu de quartzo…

 

E me cravou esta lápide no peito.

 

 

de  O uivo do lobisomem


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