ARIANA
ao Abel
Teixeira
Do pouco ou nada
feito não revelo
qual o passo que
dei ou que vou dar.
Do enxofre e mercúrio digo apenas
que se mordem,
que mútuos se contêm,
que todo o sal é
lágrima de Maio.
Poderei dizer
mais: que o fogo é lento
e húmida é a
via. A seca, não.
(Nunca o rápido
amor me dá contento.
Nem há cultura
fácil, fácil vento.
Qualquer trigo
veloz sabe a traição).
Digo ainda, da
via, que são sete
as águas deste
denso e longo mar.
Ao terceiro
degrau já se promete
o peixe que
prateia, a crepitar.
São porém as
sereias. Não cardume.
O verdadeiro
peixe – que é de lume –
a seu tempo
virá, mas devagar.
Primeiro, há-de
toldar-se em nevoeiro
o velo, vinte
vezes (só morrendo
vinte vezes
terríveis se renasce).
Entretanto, uma
aberta: o arco-íris.
Depois, de novo,
a noite, a fermentar-se.
Haverá, de
manhã, menos indício
na espuma da
maré, no barco estreito,
do que nos olhos
puros de quem vê,
ou antes, adivinha.
- Tu, que me segues, crê:
No ovo luz a
vinha!
FULCANELLI
Ao microscópio,
gotas de cristal.
Á vista
desarmada, pó vermelho.
Uma pitada leve,
como o sal,
um fervilhar – e
eis prata o que era estanho.
Só que da mão depende o bem que tenho,
o gesto firme,
próprio, sem o qual
teria tudo
apenas o tamanho
que tem, antes
da luz, a catedral.
Assoprador?
Adepto? Não sei bem…
Sei que todo me
dou, que nada espero,
que por amor
somente transmutei
na semente mais
viva o vil minério.
Prata quis.
Prata fiz. Ouro farei
mordendo as
águas turvas do mistério.
MANSÃO FILOSOFAL
Erguem-se os
dedos. Crispam-se no todo.
Mas algo falta
para o todo ser.
Algo que mora
num dedal de fogo,
nessa palavra
que não sei dizer
mas salta certa,
célere, no sopro
irreprimível que
de Urano vem
dar de repente
vida nova ao corpo,
ceder razão ao
que razão não tem.
É o dédalo
negro, o labirinto,
a chave justa
para libertar
no firmamento a
névoa do que sinto.
Mas é também
oráculo. O olhar.
O ver, sem fim,
distinto, o indistinto
no desfazer da
pedra tumular.
in
“CIDADE SEM TEMPO”
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