O banho das modelos
Nudez roubada da noite mais escura.
A quais espaços
naufragados pertencemos?
Negras cabeleiras tomadas
pelo banho.
Jazem as juras de amor
como uma queda de si mesmas.
"Cuido da inocência
de meu amo" – orgulhava-se
a pobre Lais a uma amiga
entre bálsamos.
"Desce sobre mim seu
corpo como o sonho de um deus",
dizia Timandra, enferma
de sua paixão.
"Não vejo outro
verso que não seja seu ardor", chegou
a escrever Calisto, cujo
corpo jamais foi localizado.
A bela Eufrosina bebia
tanto quanto Dylan Thomas.
"Onde estamos, minha
alma, se não acendo
a gramática da
volúpia?" Sabe-se que chorava muito
no banho com suas
criadas.
Sínope em silêncio sofria
suas dores secretas como
um pressentimento.
Morta no desespero do
fogo, seu corpo desfigurado
gelava a noite. Lívia foi
descrita
como uma mulher de
inteligência invejável,
não bastasse a perfeição
de seu colo que despertara o interesse de inúmeros pintores.
Quais os sacrifícios da
beleza? O crime assemelha-se a uma visão ininterrupta.
Passamos pelo banho das
jovens cortesãs, afeitas a uma geometria do amor. Com suas cores essas mulheres
contemplavam algo mais do que fábula ou parábola. Dilatavam toda a simetria
reinante no corpo de seus amantes. Foram o bulício de trevas mesmo em almas
afeitas à quietude. Cobertas de crimes, jamais deram sepultura a seus profundos
ventres que abrigaram os equívocos da aventura humana.
Em qualquer momento revela-se tua queda,
seja na máscara da volúpia, no desânimo
de certas horas guardadas longe de si ou…
Desfigura-se a eternidade em tuas imagens.
Acesso de excessos ao redor da mesma dor.
Há haveres infernais? Suspeita o poeta de
que seus versos expõem o revés de toda
moral?
Os amores de Catulo, os tiros de Rimbaud.
A poesia recolhe o ressoar de suas sombras.
Partilha consigo as indomáveis
contradições
que elegeram as cortesãs por seus
mistérios.
A fidelidade ao prazer leva consigo o
tormento
tanto quanto a eternidade ama o instante.
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