segunda-feira, 17 de agosto de 2020

Poemas alquímicos

 

Nicolau Saião, Homenagem a Fulcanelli



ALEGORIA DO MUNDO NA PASSAGEM DE ARNALDO DE VILANOVA


Ouro tigre leão e prata e crina

te esperam sob o vaso menstrual

Separarás primeiro a água e a mina

porque a Água não é um mineral

 

No coágulo te espera areia fina

e sob a areia planta sideral

que ao manto do Rei Verde se combina

porque a Planta não é um vegetal

 

Ao homem cabe o Ouro de buscá-lo

E a sua cria        morta ou imortal

tirá-la-ás do ventre do cavalo

porque o Homem não é um animal

 

E se o espelho de cobre te fascina

se te aparece o Monstro do Umbral

que à ignea terra o atro abismo ensina

e nas trevas afunda        o Bem e o Mal

 

Reduz expurga fende e ilumina

e com espada de fogo talha e inclina

porque o Fogo não é o seu sinal

 

                                                                  Mário Cesariny

                                                                  in “Planisfério e outros poemas”



ADEPTO 

                                   ao NS


Nunca morro da morte verdadeira

de que morrem os homens mais comuns.

Perseguido, renasço, intemporal,

sem ter morada certa nem fronteira.

 

De Júpiter sou filho – e do mistério.

Alberto ou Paracelso – quem me fez

sabe que nenhum túmulo me guarda

e que do amor perpétuo me acrescento.

 

Contudo, o Tempo dói-me. E, se não caibo

na pedra, a fonte humana me dá luz

(bebi demais no pó sanguinolento,

residual, da obra inteira, a vida).

 

Cumprido o ouro, louvo simplesmente,

com ele, o Pai.  Olvido-me de mim.

Nome não tenho. Nem sossêgo. Ardo.

Feiticeiro não sou, mas aprendiz.

 

 

 

                                                                         António Luis Moita

                                                                        in “Cidade sem Tempo”

 

 

MUNDO

                          ao sr. engº Paul Ducoeur (Fulcanelli)

 

A princípio não sabes

e pensas que sabes

A seguir sabes

e pensas que não sabes

No fim nada sabes

 e é então que tudo sabes.

Ainda que nada

te fite no rosto

não há grau nem posto

ao longo da Estrada

que não seja gosto

virado ao desgosto

na luz ainda errada.

Escada anti-rosto

estrada destroçada.

Ou altivo cão

luminoso e vivo

no espaço votivo

desde o céu ao chão.

Campo mais que ardido

estepe ou sertão.

Barca sem oceano

até ao minuto

da hora subida

no mar aparecida

fecundo e impoluto.

Máscara que navega

até onde chega

o olho vidrado

do dragão solene

sereno e perene

infrene, postado

no corpo e no fruto.

Verão anti-escorbuto.

Soubeste a princípio

no meio saberás

no fim buscarás

a figura ardente

a estrela maldita

o animal silente

a janela oclusa

a mão que se agita

desperta e medita

na porta doente

que usa e abusa

do peito deserto

sangrento e aberto.

 

Na boca fechada

por prata, ouro e espada.

 

                                                                        NS

                                                                        in “Os objectos inquietantes”


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