terça-feira, 13 de setembro de 2022

Um poema de José Carlos Costa Marques

 


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AS INVASÕES FRANCESAS

 

Nada de novo sob o céu.

A pilhagem dos tesouros do Eufrates teve nobres antecedentes.

A prestimosa Companhia das Índias Orientais tinha já mostrado o exemplo.

Antes dela, uma infindável guirlanda de despojos, coroada de louros

em Roma e de folhas de oliva na Hélade.

É nosso porque o roubámos pelos mais nobres dos motivos.

Proudhon nada inventou.

Roubo, a propriedade? Talvez sim, o dos antepassados.

Mas agora é nosso e bem nosso. Não interfiramos.

Se preciso for o expugnaremos outra vez com sangue,

com o nosso e sobretudo o dos outros.

E se preciso for voltaremos a roubar, com os mísseis teleguiados

pela mais fina cibernética.

É certo que Junot se apoderou de grandes arcas de metal

à sombra da Convenção de Sintra.

Justo retorno? Pois que o Terríbil, o Albuquerque,

o não tinha feito por menos.

Sempre perdem uns, sempre rapinam outros.

Engravatados, solenemente proclamamos o legítimo esbulho do pobre,

o sacrílego roer das posses do afortunado.

E o céu, o gratuito céu, o azul profundo,

que nada custa e nada vale,

nenhum testamento o legitima,

e ele aí está magnificente e indiferente cobrindo

espoliados e espoliadores

a imensa riqueza inútil a desmedida insuportável miséria

e a fraternidade é essa.

 

in “Safra do regresso”






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